Tirando de um bolso para devolver para o outro

Estão aí 3 tabelas que resumem os encargos sobre a folha de pagamentos. Impostos (e vou considerar INSS e FGTS como impostos, pois são usados pelo governo) representam 58,65% dos encargos. O restante considero parte do salário.

Então, para um empregado registrado em carteira, o empresário gasta quase 60% do salário nominal com impostos. É disso que se trata. Aí, vem a brilhante ideia de instituir a CPMF para substituir essa carga tributária.

Economicamente não faz sentido. Pode até criar mais empregos registrados (não vai afetar, por óbvio, os informais), mas a massa salarial permanecerá a mesma, pois a carga tributária permanecerá a mesma. Em outras palavras, o que for ganho em termos de emprego, será perdido pela perda do poder de compra causada pela CPMF. Não há mágica: o governo estará confiscando o mesmo montante da sociedade, então a sociedade como um todo permanecerá pobre como sempre.

E a própria criação de novos empregos é incerta. O empresário pode simplesmente engordar seus lucros com a desoneração, sem contratar um mísero empregado a mais. Aliás, isso é o mais provável, dada a ainda muito lenta recuperação da atividade. Teríamos então um transferência de renda dos trabalhadores (via CPMF) para os empresários.

Então, na melhor das hipóteses, a criação da CPMF é neutra, pois mantém a carga tributária do mesmo tamanho. Mas essa é a melhor das hipóteses. Na pior, a CPMF vai introduzir ainda mais areia na engrenagem da já emperrada economia brasileira. A um sistema tributário caótico, introduziremos mais um imposto ruim, pois incide em cascata e serve de subsídio cruzado, no país dos subsídios cruzados que infernizam quem quer produzir e consumir. O governo deveria estar preocupado em encontrar formas de diminuir a carga tributária, ao invés de propor remendos que deixam a coisa ainda pior. Esta era, aliás, a promessa de campanha.

Direito à moradia

Fico verdadeiramente emocionado quando astros da MPB e banqueiros lutam por justiça social e direito à moradia.

É sinal de que, logo logo, teremos direito a morar em uma de suas mansões.

A bandeira do anti-petismo

Em seu artigo semanal, Guzzo toca em um ponto que discuti ad nauseam durante as eleições: a ridícula estratégia de Alckmin durante a campanha. Em uma eleição quase plebiscitária, onde se estava decidindo se o PT deveria ou não voltar ao poder, Alckmin atacava Bolsonaro usando justamente as bandeiras do PT, chamando-o de homofóbico e misógino, ao invés de tentar se colocar como “O” candidato anti-PT. E não adiantava (como não adiantou) dizer que seria o único capaz de bater o PT no 2o turno. Afinal, de que servia ter um candidato como Alckmin no 2o turno, se ele não era um “antipetista de verdade”?

(Só um parênteses: pesava também contra Alckmin o fato de ter uma base de partidos do chamado “centrão” a apoiá-lo, em uma eleição “anti-sistema”. Então, mesmo que tivesse se travestido de “o anti-petista”, acho que não chegaria ao 2o turno. Mas, provavelmente, teria mais do que os 5% de votos que teve. Fecha parênteses).

Não é à toa que Bolsonaro elegeu Witzel e, num segundo plano, Doria, como seus inimigos mortais. As suas diatribes contra os governadores têm, na verdade, esses dois como alvos. Ao contrário de Alckmin, Witzel e Doria, principalmente o primeiro, têm irrefutáveis credenciais anti-petistas. Em uma eleição, disputariam o mesmo eleitor. Huck, por outro lado, representa essa elite de consciência pesada (o que Guzzo chama de “banqueiro de esquerda”) que não vai a lugar algum, como Alckmin não foi.

Mas (e esse mas é importante) ainda estamos a pouco menos de 3 anos das eleições. É uma eternidade. Teremos que ver se o sentimento anti-petista será o principal fator de decisão do eleitor em 2022. Se não for mais, os termos da eleição mudam. Por isso, o Supremo (ao revogar a prisão após condenação em 2a instância), o Papa, a prefeita de Paris e júri do Oscar vêm prestando um grande serviço ao bolsonarismo, ao manter a chama do anti-petismo acesa. Só falta, como cereja do bolo, o Supremo liberar a candidatura do não-proprietário do triplex. Desconfio de que este seja o sonho secreto de Bolsonaro.