Capitalismo na selva

Estudo patrocinado pela Natura mostra que o PIB das cadeias produtivas da “sociobiodiversidade” no Pará é 3 vezes maior que o PIB do próprio estado. Este PIB “oculto” não estaria sendo captado pelo IBGE porque o acesso aos produtores seria “muito difícil”, segundo a reportagem.

Bem, não tive acesso ao tal estudo, não conheço a metodologia. Mas sei que PIB é a soma de tudo o que é vendido para as pessoas. Portanto, imagino que o que deve ter sido feito foi encontrar os produtos das tais cadeias de produção no Pará (açaí, castanha do Pará, palmito etc) à venda em todo o país e somar seu valor de venda. A reportagem menciona a pesquisa em mercados de outros estados. Portanto, a diferença entre este “PIB” e o PIB oficial seria a diferença entre o valor de venda desses produtos para outros estados e o valor da venda nos mercados desses outros estados. Além disso, como várias dessas comunidades não devem ser registradas, sua produção não aparece no PIB oficial.

Mas o que mais me chamou a atenção na matéria foi a declaração final da diretora da Natura. Segundo sua avaliação, essas cadeias “biodiversas” são um exemplo de como é possível gerar riqueza sem “concentrar renda” e “gerar desigualdade”. Quase caí da cadeira.

Antônio Seabra e Guilherme Leal, fundadores da Natura, são literalmente bilionários, estão entre os 100 indivíduos mais ricos do Brasil com certeza. Mesmo a tal diretora deve receber um salário que um produtor de açaí do Pará nunca jamais poderá imaginar um dia ganhar. A Natura é a prova viva de como qualquer atividade produtiva, por mais socioambiental que seja, concentra renda.

Quem me acompanha aqui sabe que não tenho absolutamente nada contra que empresários se tornem bilionários, muito pelo contrário. Se conseguiram, foi porque tiveram habilidade para criar valor para os seus clientes. Não fossem Antônio Seabra e Guilherme Leal, provavelmente grande parte da “riqueza” natural brasileira continuaria enterrada na floresta, e várias comunidades não teriam a sua fonte de renda. Portanto, os bilhões dos donos da Natura são muito merecidos.

O que não dá é patrocinar esse conto-de-fadas idílico, em que os “povos da floresta” e as “comunidades ribeirinhas” podem explorar as riquezas da natureza sem agredir o meio ambiente e, ainda assim, ganhar muito dinheiro. Quem ganha dinheiro é o empresário que transforma e leva esses produtos para quem está disposto a pagar por eles. O resto é narrativa para sair bem na foto.

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