O limite do ridículo

Está rodando nas redes bolsonaristas um comparação produzida pelo Luciano Hang (também conhecido como Véio da Havan), mostrando dois mapas da América do Sul, um de 1965 e o outro de 2022. No primeiro, o Brasil aparece com participação de 27,43% do PIB sul-americano, enquanto que, no segundo, a mesma participação está em 50,12%, quase o dobro.

Mas o detalhe, digamos, cômico, da comparação é a cor do mapa: em vermelho, todos os países com governos de esquerda, em preto os países com governos de direita e em azul o Brasil. Detalhe, a orientação ideológica é a do governo ATUAL. Ou seja, atribui-se o que quer que seja que se queira concluir com esses mapas aos governos atuais, quando se trata de uma evolução dos últimos 57 anos. Ou seja, uma coisa sem pé nem cabeça.

Fui dar uma checada nos dados. O Banco Mundial mantém a base de dados de onde foram tiradas essas informações. Reproduzi, com os mesmos dados, a evolução da participação do Brasil no PIB sul-americano desde 1965 até 2021 (este é o ano correto, não 2022, como aparece no mapa). O gráfico está a seguir.

Podemos observar que o Brasil atinge 50% de participação do PIB sul-americano em 1975, após o “milagra econômico”. O mesmo governo militar derrubou essa participação a 40% em 1985, quando entregou o poder aos civis. De 1985 a 1994, temos fortes oscilações, provavelmente causadas pela hiperinflação. Vamos lembrar que se trata de PIB em dólares, o que é muito influenciado pelo câmbio usado. A partir de 1995, temos uma estabilização em 55%, interrompida pela desvalorização cambial de 1999, para ser retomada a partir de 2002.

Mas o mais engraçado vem agora: o melhor momento da participação brasileira no PIB sulamericano ocorre a partir de 2007, segundo mandato de Lula, quando estabiliza em 55%, chegando a quase 60% em 2011, provavelmente em função da forte valorização do real nesse ano. A partir de 2012, e até 2019, a participação fica mais ou menos estável em 55%, recuando para os atuais 50% nos dois últimos anos, justamente o período do governo Bolsonaro.

Então ficamos assim: a participação do Brasil no PIB sulamericano ficou em 55% durante praticamente todo o governo do PT, e só recuou para 50% quando Bolsonaro assumiu. Aliás, a participação de 2021 é a pior desde 2001.

Obviamente, não quero dizer com isso que o governo do PT foi melhor do que o governo Bolsonaro, em termos econômicos. Mesmo porque, essa série de participações no PIB sulamericano não faz o mínimo sentido para tirar qualquer conclusão que preste. Meu único ponto é que tem um limite para o ridículo. O PT também faz esse tipo de mistificação, mas normalmente eles são mais competentes.

Certamente Luciano Hang não toca suas empresas com esse tipo de interpretação das estatísticas econômicas. Bem, espero que não.

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