O IPCA fechou o ano de 2022 em 5,79%, acima, portanto, do teto da meta para este ano, que era de 5,00%. Pela segunda vez consecutiva, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, precisará escrever uma cartinha endereçada ao CMN, explicando o fracasso.
O atual sistema de metas de inflação foi instituído em 1999, após a desistência da âncora cambial naquele ano. A ideia é ancorar as expectativas dos agentes econômicos em torno da meta de inflação, sabendo que o Banco Central agirá tempestivamente para trazer a inflação para a meta se houver algum desvio. Como tudo no Brasil, a coisa até funciona, mas no limite da responsabilidade.
Com uma meta e bandas em torno dessa meta para absorver choques inesperados, espera-se que, ao longo do tempo, a inflação tenha um comportamento simétrico em torno da meta, às vezes acima, às vezes abaixo da meta. Mas não é o que observamos.
Dos 24 anos de vigência do sistema de metas de inflação no Brasil, em nada menos que 18 (75%) a inflação ficou acima da meta. E dessas 18 vezes, em 5 a inflação estourou a banda superior. Por outro lado, das 6 vezes em que a inflação ficou abaixo da meta, em apenas uma vez (no ano da graça de 2017) a inflação estourou a banda inferior. Temos então, claramente, uma leniência em relação à inflação por parte dos banqueiros centrais brasileiros ao longo dos anos, que se traduz em inflação consistentemente mais alta do que a meta estabelecida.
Esse fato torna a vida do banqueiro central mais difícil, pois os agentes econômicos, com base nesse histórico, tendem a projetar uma inflação mais alta do que a meta, exigindo juros mais altos do que o necessário para ancorar as expectativas, caso o BC tivesse mais credibilidade.
Minha tese é de que o comportamento fiscal do governo acaba por exigir um nível de juros não palatável do ponto de vista político, o que leva o BC a sempre ficar “atrás da curva”, como dizemos no mercado, topando, na média, uma inflação um pouco maior. Assim, o sistema de metas foi “abrasileirado”, com a meta servindo, na prática, de piso para a inflação. Quero crer que a independência formal do BC mude esse quadro. Mas admito que se trata mais de uma esperança do que de uma convicção.