Eugênio Bucci nunca me decepciona. Dessa vez não foi diferente.
No final de um artigo em que desanca Bolsonaro por suas falas no momento do impeachment e contra a deputada Maria do Rosário, o professor da ECA-USP falseia a história para que caiba em sua narrativa.
Ao defender a ditadura militar, Bolsonaro estaria atingindo o alicerce mesmo da frágil democracia brasileira, a saber, o consenso de que houve tortura e ditadura praticadas pelo Estado brasileiro.
É uma bela narrativa. Pena que seja falsa.
O consenso que permitiu a volta do regime democrático foi uma anistia ampla, geral e irrestrita para ambos os lados da contenda. A anistia foi o que permitiu serenidade de ânimos para que pudéssemos seguir em frente. Foi diferente, por exemplo, na Alemanha, onde a condenação ao nazismo permitiu o ressurgimento do país aos olhos do mundo e de si mesmo.
Seria como se outro dissesse que a democracia brasileira repousa sobre o consenso de que a esquerda brasileira queria implantar uma ditadura comunista no Brasil, e que qualquer dissenso sobre isso seria uma grave ameaça às nossas instituições.
Quero deixar claro que, assim como Bucci, acho as falas de Bolsonaro inaceitáveis. Isso é uma coisa. Outra coisa é dizer que houve consenso sobre aquele período tenebroso da história. Tanto não houve, que Bolsonaro tem 30% de intenções de voto, mesmo falando tudo o que ele fala. Ou, talvez, por tudo o que ele fala.
Houve uma anistia ampla, geral e irrestrita, que é a forma brasileira de resolver conflitos. Mas esse assunto insiste em não morrer, e por culpa única e exclusivamente das esquerdas, que insistem em Comissões da Verdade e punições, em clara afronta ao consenso primordial, qual seja, a anistia.
Bolsonaro é apenas a reação encarnada à tentativa de empurrar goela abaixo da sociedade um consenso que não houve.