Mudaram por que?

Não só Dias Toffoli, mas também Gilmar Mendes “refletiram melhor” e agora defendem a execução penal após o julgamento do STJ (3a instância).

De todos os posicionamentos no STF, este é o mais cínico, pela conveniente mudança de posicionamento em um assunto que é, por si, arbitrário.

Celso de Mello, pelo menos, é fiel a um princípio: o trânsito em julgado. Saiu do trânsito em julgado, qualquer outro posicionamento é arbitrário. Por que 3a instância e não 2a? Por que 2a instância e não 1a? A prisão após a 2a instância é tão legítima quanto após a 1a ou a 3a. A diferença está somente no grau de convicção da justiça com relação àquele crime. Como ensina Tofolli, nas duas primeiras estabelecem-se os fatos, e nas duas outras averiguam-se questões de legalidade, se o processo em si não teve nenhuma ilegalidade. Ou seja, a culpa já está estabelecida após a 2a instância, o que o STJ faz é apenas julgar se aquela culpa foi provada de maneira legal. Se não tiver sido, o processo é anulado, mas o culpado não deixa de ter cometido o crime. Por isso, parece razoável colocar o início da execução da pena após condenação em 2a instância, posição desde sempre de Gilmar Mendes e Dias Tofolli.

Por que mudaram? Mudaram porque?

Orgulho!

Ilustrando meu post de ontem, matéria de hoje destaca a luta do excelentíssimo decano do STF em prol dos direitos dos manos contra a sanha punitivista que vem assolando o país. Orgulho!

Data máxima vênia

Desde o julgamento do HC de Lula, vinha procurando um trecho do voto do decano Celso de Mello que me chamou a atenção. Finalmente encontrei. Aí vai:

“É por isso que se mostra inadequado invocar-se a prática e a experiência registradas nos Estados Unidos da América, na República Francesa ou no Reino da Espanha, entre outros Estados democráticos, cujas Constituições, ao contrário da nossa, não impõem a necessária observância do trânsito em julgado da condenação criminal, mesmo porque não contêm cláusula como aquela inscrita em nosso texto constitucional que faz cessar a presunção de inocência somente em face da definitiva irrecorribilidade da sentença penal condenatória (CF, art. 5o, inciso LVII), o que revela ser mais intensa, no modelo constitucional brasileiro, a proteção a esse inderrogável direito fundamental.”

Vou repetir a última frase, que me parece a chave para entender porque estamos na m..da que estamos: “o que revela ser mais intensa, no modelo constitucional brasileiro, a proteção a esse inderrogável direito fundamental.”

Em outras palavras: a Constituição brasileira é uma das poucas no mundo (acompanhada das ilustres companhias de Portugal e Itália) que tem essa estrovenga na Constituição. Isso significa que tornar uma pessoa culpada é quase um milagre.

Note o entusiasmo do decano com esse dispositivo. Aplaude-o com entusiasmo, como se a falta de proteção da sociedade em relação aos criminosos representasse um avanço civilizatório. Países atrasados como EUA e França, na visão do excelentíssimo, deveriam seguir o exemplo do Brasil!

Com esse tipo de mentalidade, não é à toa que o Brasil é o país da impunidade. Dos vários REFIS, passando pela progressão de pena e inimputabilidade dos “de menor”, até a prisão somente após o “trânsito em julgado”, o crime compensa no Brasil.

Para nós, otários, que procuramos cumprir as leis, toda essa discussão é etérea. Provavelmente não precisaremos, ao longo de nossas vidas, dos vários recursos de que os criminosos dispõem para se livrarem da devida punição. Pelo contrário: é a sociedade que está indefesa em relação ao crime. Sob as bênçãos dos defensores dos direitos dos manos.

Chega de impunidade!

“A Constituição proclamou a presunção de inocência. Diz, no artigo 5º, que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. É um retrocesso que se impõe em matéria de direito fundamental (a prisão antecipada), porque a Constituição está sendo reescrita de uma maneira que vai restringir o direito básico de qualquer pessoa” – Celso de Mello, decano do STF, em entrevista a O Globo.

O decano cita a alínea 57 do artigo 5o. No entanto, a alínea 78 do mesmo artigo diz o seguinte: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.”

Como compatibilizar as inúmeras chicanas possíveis até que o processo seja considerado “transitado em julgado” e o direito que a sociedade tem de ver um bandido na cadeia o mais rapidamente possível? É esta a resposta que foi dada pelo STF ao admitir a prisão após a condenação em 2a instância por órgão colegiado. Na boa, quem está preocupado com este “direito básico de qualquer pessoa” são os bandidos, os seus advogados e alguns ministros do STF que se apegam à literalidade de uma determinada alínea e convenientemente se esquecem de todo o resto.

Defesa do direito básico de qualquer pessoa? Qualquer pessoa quem, cara pálida? No dia em que eu for condenado em 2a instância, pode me prender, sem problemas. O cidadão honesto é quem fica desprotegido com essa “proteção a qualquer cidadão”. Chega de impunidade!