O que precisa ser estudado

O editorial do Estadão dá voz à perplexidade que tomou conta de alguns círculos bem-pensantes do país diante dos resultados eleitorais, particularmente para o Legislativo. Por ”razões ainda a serem estudadas”, os eleitores escolheram ministros completamente ineptos para representá-los no Congresso.

Vou dar aqui minha humilde contribuição para os “estudos” a serem feitos.

Comecemos com Damares e Salles. A questão, talvez, não é que tenham sido incompetentes. Pelo contrário. Esses dois ministros foram vistos como muito competentes na implementação da agenda vencedora das eleições de 2018, o que inclui valores conservadores da família e o uso da floresta para o desenvolvimento econômico. Para desgosto do Estadão, existe uma parcela da população que endossa essas agendas e viu em Damares e Salles seus legítimos representantes.

Já o caso de Pazuello é outro. As centenas de milhares de mortes causadas pela Covid certamente não fazem parte da agenda de ninguém. A perplexidade aqui é outra: como pode a população premiar com um mandato parlamentar um “negacionista”? O editorial reconhece que não dá para colocar 100% das mortes por Covid nas costas do governo, mas atribui à dupla Bolsonaro/Pazuello a transformação de uma calamidade em uma tragédia.

Será esta mesmo a percepção de toda a população? Creio que não. Para uma parcela dos eleitores, a Covid foi o que foi, ceifou vidas no mundo inteiro, e mesmo países com governos “responsáveis” sofreram muito com a doença. Bolsonaro deve ter perdido votos preciosos com seu discurso anti-vacina, mas não o suficiente para evitar que seu lugar-tenente fosse eleito. Aliás, pelo contrário: o discurso anti-vacina agrada uma parcela dos eleitores, o suficiente para eleger um seu representante no Congresso.

Por outro lado, o editorial constata, perplexo, que Bolsonaro obteve mais de 50% dos votos em Manaus, o epicentro da CPI da Covid. Aqui já não se trata de uma parcela da população, mas de sua maioria. Como explicar? Já tive oportunidade de escrever sobre isso aqui: os eventos de Manaus se encaixam em um contexto em que a população já está acostumada a não ter assistência decente de saúde. A população, em grande parte, simplesmente não ligou o que aconteceu com o governo federal, dado que os hospitais são estaduais ou municipais. A CPI tentou fazer essa ligação, mas só teve sucesso com quem não mora em Manaus.

Por fim, a simples ligação com Bolsonaro não foi o suficiente para eleger parlamentares. Queiroz e Wasseff não foram eleitos, por exemplo. O que reforça a tese de que não basta ser bolsonarista, é preciso trabalhar pela agenda que ele representa. O bolsonarismo é maior do que Bolsonaro. É isso que precisa ser estudado.

Apenas um evento

O que é um EVENTO?

EVENTO é um acontecimento organizado (festa, espetáculo, comemoração, solenidade etc.) com objetivos institucionais, comunitários ou promocionais.O que é um comício ou uma manifestação política?

Um comício ou uma manifestação política é um EVENTO. Um evento organizado de promoção de um político ou de uma ideia política, com ou sem a presença de políticos. Por exemplo, comícios eleitorais ou o comício das Diretas Já ou as manifestações pró-impeachment da Dilma ou de apoio a Bolsonaro.

Está certo, portanto, o Exército Brasileiro em dizer que o general Pazuello participou de um EVENTO.

O amor cega

– Amor, que cara é essa?

Edneia notou que havia algo errado assim que entrou em casa. Seu marido estava sentado no sofá, com aquele fogo nos olhos que ela conhecia de outros carnavais.

– Senta aí, Edneia.

Sinal péssimo. Chamou pelo meu nome, pensou Edneia. Nesses momentos, o apelido “Neia” era guardado na gaveta.

– O que foi, Nil, o que aconteceu? Edneia pensava que usando o apelido carinhoso de Adnilson poderia desanuviar o ambiente. Ledo engano.

– Vem ver o que me mandaram. Adnilson abriu o notebook e deu play. Ali estava claro: Edneia e um homem transando. Não havia dúvida, era Edneia. E não havia dúvida, estavam transando. O nome do motel estava em uma placa na parede. O motel ficava perto de sua casa.

– E-E-Eu posso explicar!

– Explicar o quê, Edneia! Não tem explicação isso aqui! Vou ligar para o meu advogado agora mesmo para pedir o divórcio!

– Calma, Nil, me ouça! Vou explicar!

– Ok, sou todo ouvidos, vamos lá.

– Veja, esse rapaz, ele trabalha na empresa. Ele é muito bom, está fazendo um curso de enfermagem à noite. Me convidou para um almoço nesse motel. Achei estranho, mas fui. Enquanto estávamos almoçando no quarto, ele me pediu para realizar alguns procedimentos que ele havia aprendido no curso. Foi só isso, juro!

– Então vocês foram ao motel só para almoçar?

– Isso!

– E esses movimentos são práticas do curso de enfermagem?

– Exatamente!

– Puxa, Neia, como pude desconfiar de você. Vem cá meu amor, você me perdoa?

– Claro Nil, eu sei que as coisas nem sempre são como parecem…

E se beijaram apaixonadamente.

Moral da história: o amor cega.

Começa a corrida

A foto da senhorinha inglesa tomando a primeira dose da vacina da Pfizer ganhou a primeira capa dos principais jornais do mundo.

Não importa se, como estão alertando quem entende do assunto, as campanhas de vacinação ainda levarão meses (provavelmente mais de um ano) para surtirem efeito e nos permitirem voltar a uma vida normal. Como diz um velho provérbio chinês (todo velho provérbio é chinês ou árabe), um longo caminho começa com o primeiro passo.

Todos os países com um mínimo de organização estão anunciando o início de suas campanhas de vacinação para este mês ou, no mais tardar, janeiro. Aqui, será em março, se não chover.

A foto de uma senhora de 90 anos tomando a vacina vale mais do que mil jogos de palavras. Escancara aquilo que poderíamos ter e não temos. Nas próximas semanas, campanhas de vacinação começarão ao redor do mundo, piorando a percepção dos brasileiros a respeito do seu próprio governo.

Run, Pazuello, run.