Satélite do lulopetismo

O que vai abaixo são trechos de uma entrevista de Sérgio Fausto, diretor executivo do Instituto FHC e uma das principais cabeças pensantes do PSDB. Talvez seja a evidência mais evidente de porque o PSDB tornou-se um partido nanico na última eleição presidencial e, tudo indica, continuará assim. Basta lembrar que a votação de Alckmin foi, de longe, a menor que o partido recebeu desde a redemocratização.

Sérgio Fausto coloca Lula no “centro democrático” e defende o apoio a Lula em um eventual 2o turno contra Bolsonaro. Na parte cômica da entrevista, o diretor do Instituto FHC diz que espera o apoio de Lula a um eventual candidato do PSDB no 2o turno contra Bolsonaro. O mundo do humor definitivamente está perdendo um grande talento.

Mas é para a última pergunta que eu gostaria de chamar a atenção. Não pela resposta, mas pela pergunta em si. O entrevistador questiona se seria o caso de o PSDB “voltar ao antipetismo”.

A pergunta é curiosa em dois sentidos. Primeiro, só se volta a algo quando este algo esteve presente antes. Com exceção das poucas semanas das campanhas eleitorais, o “antipetismo” do PSDB se resumiu a um silêncio obsequioso, mesmo vendo o legado do governo FHC sendo sistematicamente destruído e a máquina do Estado sendo transformada em apêndice do partido. Para o jornalista, o simples fato de estar do outro lado no 2o turno em seis eleições torna o PSDB automaticamente antipetista. Não, não torna.

Bolsonaro conseguiu encarnar o antipetismo, e por isso foi eleito. Confesso que errei, na ocasião, o meu prognóstico. Achei que as eleições seriam marcadas pela luta contra o establishment político e, portanto, apostei que Bolsonaro iria enfrentar, no 2o turno, um candidato do establishment, no caso, Alckmin. Descartei a priori um candidato do PT no 2o turno como representante do establishment porque, afinal, Lula estava preso. Qual a chance? Quebrei a cara ao subestimar a força eleitoral de Lula.

Aprendi, naquelas eleições, que Lula e o PT têm lugar garantido no 2o turno de qualquer eleição presidencial, faça chuva, faça sol. Portanto, o discurso antipetista é o único que, com sorte, tem alguma chance de vingar. Digo com sorte porque é preciso que o eleitorado seja majoritariamente antipetista, como foi em 2018. Isso está longe de estar garantido.

Que me perdoem os fãs do capitão, mas Bolsonaro é uma figura irrelevante. Passará, como passaram Collor e Dilma. O que realmente importa é Lula e o PT. É nesse eixo que gira a política brasileira. Ser antipetista é a única forma de se posicionar com sucesso no tabuleiro político. Ou se está com eles, ou se está contra eles. E este é o segundo aspecto interessante da pergunta do entrevistador. A pergunta é boa porque capta justamente esse ponto: o candidato da terceira via precisa ser antipetista para ter alguma chance de sucesso. Fausto reconhece o ponto em sua resposta, dizendo tratar-se de um recurso eleitoral. É óbvio, estamos falando de ganhar eleições.

FHC, Sérgio Fausto e a ala que eles representam do PSDB já fizeram a sua escolha: preferem ser satélites do lulopetismo. Não é à toa que o partido foi dominado por João Doria.

Para não esquecer

Marcos Mendes manda a real sobre a tentativa de reabilitar o PT pelo lado econômico, esforço em paralelo à reabilitação política.

Um belo resumo do desastre dos anos petistas na condução da economia, vale a leitura.

O banco sem banqueiro

Marco Maia, a exemplo de Lula e tantos outros, era um torneiro mecânico que se envolveu com o sindicalismo e, daí, saltou para a vida partidária. Elegeu-se deputado federal pelo RS em 2006 e permaneceu na Câmara dos Deputados por três legislaturas. Foi eleito presidente da Câmara em 2011, primeiro ano do mandato de Dilma, quando o PT ainda dava todas as cartas.

No entanto, Marco Maia foi varrido junto com a onda anti-petista nas eleições de 2018, tendo obtido apenas um terço dos votos que havia angariado em 2014. Sem cargo, o que fazer? Lamuriar-se num canto? Nada disso! Marco Maia foi à luta e decidiu ser… banqueiro!

Reportagem de hoje traz o novo empreendimento de Marco Maia: o LeftBank, um banco sem banqueiro, segundo a propaganda. Assim é se assim lhe parece.

Maia não esconde o jogo: seu objetivo é utilizar a grife “esquerda” para angariar clientes.

Há uma ligação sentimental, um instinto de pertencimento dessas pessoas que se identificam com a esquerda, que Maia quer explorar. Quem diria que a esquerda, sempre tão identificada pela luta contra o consumismo capitalista, virasse grife para atrair consumidores. E de um banco que não é estatal! Esse mundo está de pernas para o ar mesmo.

Lula será o candidato

A mando de Lula, Haddad se auto-anunciou como pré-candidato do PT à presidência nas eleições de 2022.

Como interpretar esse movimento?

A primeira coisa que me chamou a atenção foi o fato de que o anúncio foi feito por Haddad e não pela direção do partido. Em qualquer partido sem dono, há uma briga de foice pela legenda entre vários pretendentes. Não no PT. O PT tem dono.

O segundo aspecto que me chamou a atenção foi o silêncio de Lula. Foi Haddad a fazer o anúncio, citando Lula. Por que não o próprio Lula a ungir o seu pré-candidato? Aliás, o silêncio de Lula tem sido ensurdecedor desde a sua saída da prisão. Tínhamos mais notícias de Lula durante a sua estadia em Curitiba do que depois.

Uma pista para esse silêncio pode ser encontrada na notinha da Coluna do Estadão, encomendada por “ministros do Supremo”. Segunda a nota, o anúncio da pré-candidatura de Haddad “baixa a fervura” do julgamento a respeito da parcialidade de Moro, o que abriria as portas para a anulação da sentença e, consequentemente, a purificação da ficha de Lula. Em outras palavras, o julgamento no Supremo seria absolutamente técnico, pois o seu viés político (permitir a candidatura de Lula) estaria mitigado pelo anúncio de uma alternativa “viável”.

Bem, todos esses movimentos apontam para uma candidatura Lula em 2022. Seu silêncio é o da raposa que sabe que não ganha nada ficando ao sol dois anos antes da eleição. Ele não precisa trabalhar para ser conhecido, então não precisa começar a fazer campanha já. Aliás, a votação de Andrade em 2018 mostra que Lula consegue uma votação expressiva mesmo não aparecendo na cédula.

Como nota cômica, a matéria traz o depoimento de Boulos, reclamando que o PT deveria “discutir projetos” antes de “discutir nomes”. O sujeito acha realmente que existem chances de o PT apoiá-lo em 2022. Não consigo parar de rir.

O candidato do PT em 2022 será Lula.

PS.: há uma outra hipótese para o sumiço de Lula: ele estaria doente e, de fato, a unção de Haddad representaria uma passagem de bastão dentro do partido. Desse modo, o julgamento no STF serviria para dar um lustro na biografia do condenado, mais do que abrir as portas das eleições. É só uma hipótese menos provável.

O verdadeiro motivo

A disputa pela presidência do Senado está bem menos estridente do que a da Câmara, mas não deixa de ser muito interessante.

Ao contrário da Câmara, onde anunciou apoio ao candidato de oposição ao governo Bolsonaro, no Senado o PT se junta ao governo. Depois de tartamudear algumas justificativas sem nexo, o líder do PT expõe o real motivo do apoio do partido: a “garantia dos direitos fundamentais”. Lê-se, a garantia de que Lula possa disputar as próximas eleições.

Esqueça todo o resto. Só existem dois partidos no Brasil: o partido da Lava-Jato e o partido da Corrupção como Forma de Fazer Política. É nessas horas que fica claro a que partido o nosso político de estimação pertence.

A natureza do escorpião

Às vésperas do 1o turno de 2018, uma manifestação #elenão havia sido convocada para o Largo da Batata, aqui em São Paulo. Um amigo, muito inteligente e a quem prezo muito, tentava me convencer a comparecer ao tal ato. O raciocínio era o seguinte: quanto mais gente fosse, mais ficaria claro que havia uma rejeição grande ao nome de Bolsonaro. Portanto, Alckmin tinha mais chance de vencer o PT no 2o turno, e haveria uma migração de votos de Bolsonaro para Alckmin. Minha resposta foi a seguinte: essa é a eleição anti-PT. Não é engordando uma manifestação claramente do PT que o Alckmin vai ganhar alguma coisa. Alckmin iria perder a eleição porque tinha escolhido o adversário errado: estava atacando Bolsonaro, quando devia estar atacando o PT. Não seria minha presença em uma manifestação de revolucionários da Vila Madalena que iria mudar isso.

Lembrei desse diálogo enquanto lia a entrevista, no Valor, do prefeito reeleito de Araraquara, Edinho Silva, um dos raros casos de sucesso do PT nessas eleições. Ainda mais quando se considera que foi tesoureiro da campanha de reeleição de Dilma Rousseff em 2014.

Edinho propõe uma “frente” de partidos de esquerda, dialogando com partidos de centro, para “recolocar o Brasil no caminho da democracia”. Uma espécie de reedição do #elenão. São tantos embustes em um pensamento só que fica difícil até argumentar.

Pra começo de conversa, “recolocar o Brasil no caminho da democracia” não deixa de ser uma frase esquisita para um partido que saúda a “democracia” da Venezuela e tem em Cuba um modelo de sociedade.

Em segundo lugar, Edinho quer fazer aliança com partidos que, pelo menos até o momento, o PT considera como golpistas. Como “recolocar o Brasil no caminho da democracia” aliado a partidos “golpistas”? Uma contradição em termos. Na entrevista, Edinho ensaia um mea culpa a respeito da corrupção do partido, mas não diz uma mísera palavra que poderia servir de ponte para rever esse posicionamento.

Além disso, o PT cansou de bater nos chamados “partidos de centro” enquanto estava no poder. Todos eram fascistas. De modo que fica difícil entender uma aliança com fascistas para desalojar outro fascista do poder.

Por fim, é difícil acreditar na promessa de uma “frente” com o PT. Não orna com o desejo hegemônico do partido de Lula. Poderia enganar há 20 anos. Hoje, todo mundo conhece a natureza do escorpião. Em determinada altura da entrevista, Edinho crítica a “acidez” das críticas de Ciro Gomes. Esse foi um que sentiu na pele o que significa acreditar na boas intenções de Lula.

E, por falar em Lula, o final coloca por terra toda a “sensatez” que um dos mais “conscientes” quadros do PT procurou demonstrar ao longo de toda a entrevista. Ao colocar Lula como seu candidato preferencial em 2022, Edinho implode qualquer tentativa de aproximação com quem quer que seja. Está aí, nessa resposta, o PT destilado de todas as suas tentativas de parecer um partido disposto ao diálogo. Não. Qualquer iniciativa para enfrentar Bolsonaro em 2022 não pode incluir uma aliança com o PT.

O PT não é um partido democrático

Poucos ficaram sabendo, mas o PT lançou um programa de governo . Chama-se nada menos que “Plano de Reconstrução e Transformação do Brasil”. A pretensão não é modesta, como se vê.

Destaco abaixo um trecho do preâmbulo que, para mim, deslegitima o PT como uma força a mais no jogo democrático.

O PT não é um partido democrático. Pelo menos, não no sentido em que entendemos esse regime nas democracias ocidentais. Lembremos, por exemplo, que o nome da Alemanha Oriental era República Democrática Alemã, mesmo sendo uma ditadura feroz.

O trecho diz o seguinte: “A reconstrução do Brasil exige fortalecer a democracia, traumatizada pelos processos do golpe de 2016 e da cassação da candidatura Lula em 2018,…”Em qualquer democracia, um processo de impeachment faz parte do jogo. Richard Nixon seria impichado se não renunciasse, e Bill Clinton escapou por um triz de ser impichado. Aqui no Brasil, Fernando Collor foi impichado. A nenhum deles lhes ocorreu chamar o processo de golpe. Ao desqualificar como golpista um processo conduzido, do início ao fim, dentro das regras estabelecidas no jogo democrático, o PT coloca-se fora do jogo. Simples assim.

O mesmo ocorre com a dita “cassação” do direito de Lula se candidatar em 2018. Lula estava PRESO. Havia sido condenado em duas instâncias da justiça (não somente por Sergio Moro) por corrupção passiva e outros crimes. Pode-se discutir a sentença, a suspeição do juiz, o que for. O que não se pode é chamar isso de “cassação”. Isto está fora do jogo democrático. O PT exclui-se do jogo ao desqualificar um instituto absolutamente de acordo com o que vai na Constituição.

Outro dia, teve início um movimento que perguntava se já não estava na hora de “perdoar o PT”. Ora, só se perdoa quem pede perdão, quem está arrependido do que fez. Este documento deixa claro que o PT não está pedindo perdão. Pelo contrário.

Em qualquer democracia avançada, como Alemanha ou Japão, se o partido no poder fosse pego em um centésimo do que foi feito na Petrobrás, seus dirigentes teriam caído no ostracismo há muito tempo, quando não estariam enjaulados. No caso do Japão, talvez até rolasse um harakiri em rede nacional. Aqui, o partido se acha no direito de dizer que é o único realmente democrático. O documento em si pouco importa. Trata-se de um amontoado de baboseiras escritas como se o PT nunca tivesse sido governo, como se o desastre Dilma nunca tivesse existido. Até combater a corrupção eles prometem, vejam só! Bater no conteúdo de um documento que parece ter saído de debates de centros acadêmicos é perda de tempo.

O PT, hoje, é um morto-vivo que vive à sombra de dois políticos: Lula e Bolsonaro. Lula é o salvador, enquanto Bolsonaro é a encarnação do mal. Deus e o diabo na terra do sol, em uma dança que somente interessa aos dois. O PT, ao lançar este documento, dá sobrevida a Bolsonaro, lembra a todos porque, afinal, Bolsonaro está no poder.

Ciro Gomes hoje, em entrevista ao Valor Econômico, resumiu o ponto: “não é mais possível disfarçar que o bolsonarismo boçal é consequência do colapso moral e econômico da governança do PT.” Óbvio que Ciro tem interesse em herdar o espólio do PT, mas seu diagnóstico não deixa de ser verdadeiro.

Bolsonaro tem uma retórica muitas vezes incendiária, que beira o golpismo. Mas, pelo menos por enquanto, está a anos-luz de distância do que o PT fez para solapar a democracia, enquanto fazia um discurso “fofo”. Não, o PT não faz parte do jogo democrático. Nunca fez. E não vai ser diferente agora.

A “graxa” do capitalismo

O “jurista” Eugênio Aragão está redigindo uma nova Lei de Segurança Nacional.

Eugênio Aragão foi o mesmo que, em entrevista à Carta Capital, defendeu a corrupção como uma “graxa” para tornar os processos burocráticos mais azeitados. “No mundo inteiro é assim”, diz o “jurista”. Só se for no mundo-pária dominado por gangues.

Vai vendo o que vai sair disso aí.