Vai para o inferno!

Com tantas necessidades que clamam aos céus, estamos discutindo se o orçamento público deveria subsidiar a gasolina que eu coloco no meu carro. O inferno desse pessoal deve ter uma temperatura especial.

A lógica do preço da gasolina

Mauro Benevides, responsável pelo programa econômico de Ciro Gomes deu entrevista hoje no Valor.

Na primeira pergunta, já mostrou toda a sua ignorância de como funciona a microeconomia. Perguntado sobre a politica de preços da Petrobras, Benevides solta a pérola: “qualquer empresa no mundo fixa os preços por custo de produção”.

Não, Benevides, os preços não são definidos pelos custos de produção. Os preços são definidos por oferta e demanda. Os custos vão definir somente se a empresa vai sobreviver ou não em um determinado ambiente de oferta/demanda.

Por exemplo, o custo dos caminhoneiros cresceu com o aumento dos combustíveis. Segundo Mauro Benevides, então, o preço do frete deveria aumentar. Sim, deveria, se a demanda pelo serviço se mantiver constante no novo preço. Se a demanda cair, alguns caminhoneiros deverão sair do mercado no novo preço. Ou o preço não sobe, e ficarão no mercado apenas aqueles caminhoneiros que conseguirem trabalhar com margem mais baixa.

O caso da Petrobras é um pouco diferente, por ser uma empresa, na prática, monopolista. A competição vem apenas dos combustíveis importados. Por que, então, a Petrobras não pode simplesmente vender combustíveis com base no seu preço de custo, adicionando apenas uma “margem de lucro cidadã”?

Temos dois cenários possíveis: no primeiro, o custo está maior do que o preço internacional. Neste caso, o preço praticado pela Petrobras seria maior do que o do produto importado. Então, seria uma questão de tempo para a Petrobras perder todo o mercado de comercialização de combustíveis, quebrando a empresa.

Mas é o segundo cenário que nos interessa, quando o custo está bem menor do que os preços internacionais. Neste caso, por que a Petrobras, sendo monopolista, simplesmente não vende mais barato o combustível no mercado doméstico, beneficiando o cidadão brasileiro? Esse é o brilhante raciocínio de Mauro Benevides e, com certeza, da maioria dos brasileiros.

Para entender porque este raciocínio leva, no longo prazo, à inviabilidade da empresa, é preciso entender que o petróleo é uma commodity global, cujo preço é determinado, ao longo do tempo, por um tênue equilíbrio de oferta e demanda. Este preço, em tese, paga o risco de extração do petróleo do produtor marginal mais caro. Se há um excesso de oferta (ou falta de demanda), o preço cai, inviabilizando o produtor com maior custo de produção e, portanto, diminuindo a oferta e aumentando a demanda até se encontrar um novo equilíbrio. E vice-versa.

Claro que, neste processo, os produtores com menor custo de produção acabam por auferir maiores lucros. Mas não há modo de ser diferente pois, por ser um mercado aberto, o preço é global, e cada produtor, do mais barato ao mais caro, tem o seu papel no tênue equilíbrio entre oferta e demanda.

Agora, suponhamos que a Petrobras oferecesse aos brasileiros a bênção de uma gasolina mais barata do que aquele preço ditado pelo mercado internacional, baseando-se apenas nos seus custos. Ocorreriam duas coisas: 1) haveria uma pressão exportadora de combustíveis. Traders poderiam comprar o combustível para revender com lucro no mercado global. Claro, isso poderia ser proibido, mas sabe como é o tráfico clandestino em um país como o Brasil, né? E 2) o combustível mais barato daria um sinal de abundância para o consumidor, o que aumentaria a demanda, forçando a Petrobras a importar o produto mais caro e subsidiá-lo para o consumidor local. Foi basicamente isso que aconteceu em 2012-2013, provocando prejuízos bilionários para a empresa.

Além disso, sempre resta a discussão de qual seria a tal “margem de lucro cidadã” a ser praticada pela Petrobras. A margem de lucro deve cobrir as despesas operacionais, os investimentos a serem feitos para manter e, eventualmente, aumentar a produção, e o custo do capital, que deve ser proporcional ao risco da atividade. E, convenhamos, o risco de explorar petróleo não é baixo. No final, o preço internacional do petróleo, ao longo do tempo, procura remunerar estes três componentes. Não tem muita mágica em um mercado extremamente competitivo como o do petróleo.

Por fim, se nada disso foi convincente, então dá uma olhada na Venezuela. A PDVSA está quebrada e a produção de petróleo está despencando, mas você enche o tanque com poucos centavos. Claro, vão lhe dizer, não queremos chegar neste ponto. Sim, ninguém quer. Mas quando ideias brilhantes como a de Mauro Benevides são postas em prática, os preços passam a ser apenas um detalhe na mão de populistas. Aí, o inferno é o limite.

Melhor destino para o meu dinheiro

Sempre pensei na Petrobras como uma empresa que poderia dar bom retorno para o acionista se fosse bem gerida. Dependeria apenas do governante de plantão.

Esta crise me fez abrir os olhos (ainda que tardiamente) e descobrir que não tem jeito da Petrobras ser bem gerida. Porque o problema não é o governante de plantão. O problema é o povo brasileiro.

Tenho participado de várias discussões com pessoas esclarecidas e inteligentes, que estão convencidas de que a Petrobras deveria servir os “interesses da nação”, no caso, subsidiar os combustíveis, nem que seja “temporariamente”. Afinal, nas palavras de Ciro Gomes, se não é pra isso que serve uma estatal, pra que serve então?

Assim, o problema não é o governo, mas a mentalidade do povo. A Petrobras nunca vai dar um retorno decente para o acionista em prazos mais longos, pois seu objetivo é ser uma “empresa estatal”.

Se é para ajudar o País, tenho destino melhor para o meu dinheiro. A Petrobras nunca mais vai ver um tostão meu.

O poder de parar o País

Temer acaba de anunciar o fim do PIS/Cofins sobre o diesel.

Não consigo ser contra a redução de impostos.

Mas como a contrapartida NÃO SERÁ a redução de despesas, lamento informar que ALGUÉM vai subsidiar o diesel.

Provavelmente, alguém que não tenha o poder de parar o País.

Ciro tem razão

Nunca pensei que um dia iria dizer isso, mas Ciro tem razão.

Se não for para subsidiar combustível quando necessário, pra que serve a Petrobras?

Só faz sentido o governo controlar uma empresa se puder usá-la para seus interesses. Inclusive, dar prejuízo “quando necessário”. Se esse prejuízo terá que ser pago mais cedo ou mais tarde pelo povo, não vem ao caso. O que importa é a política populista de curto prazo, para enganar os trouxas.

A Petrobras não será privatizada nunca.

Canalhas populistas

“Se o Pedro Parente não aceitar rever a política de reajuste, que ele saia da Petrobrás ou o presidente da República exerça o mínimo de autoridade. Um governo minimamente sólido já o teria demitido. Com todo respeito a ele, a Petrobrás não é maior do que o Brasil, nem o Pedro Parente é maior do que a Petrobrás.”

Cunha Lima, Cássio. Senador pelo PSDB.

Pedro Parente certamente não é maior do que a Petrobras nem muito menos do que o Brasil. Mas com certeza é maior do que Cássio Cunha Lima e todos esses canalhas populistas que não hesitam em quebrar a Petrobras e o Brasil para sair bem na foto.

Impasse sem solução

Ainda a greve dos caminhoneiros.

Tese: nada do que o governo faça com o preço dos combustíveis irá melhorar a vida dos caminhoneiros.

Premissa: a atividade de transporte de cargas é uma atividade econômica livre, sujeita às leis de oferta e demanda. Não há oligopólios nem oligopsônios, de modo que as leis básicas da economia funcionam relativamente bem neste setor.

Hipóteses sobre a oferta: 1) houve aumento de oferta de caminhoneiros nos últimos anos ou 2) houve diminuição de oferta de caminhoneiros nos últimos anos.

Nesta quadra da vida nacional, é bem mais provável que a hipótese 1 seja a verdadeira. É difícil imaginar que, com o grau de ociosidade atual da economia, o setor de transporte seja o único que tenha falta de mão de obra. Vale lembrar que a venda de caminhões bateu recordes no governo Dilma, graças a programas de financiamento como o PSI, o que deve ter aumentado ainda mais a oferta do setor.

Hipóteses sobre a demanda: 1) houve aumento de demanda por transporte por caminhão nos últimos anos ou 2) houve diminuição de demanda por transporte por caminhão nos últimos anos.

Também aqui, é mais provável que a hipótese 2 seja a verdadeira, em função da profunda recessão que o país atravessou. É possível também que a demanda tenha diminuído porque deslocou-se para outros meios de transporte, em função do preço do frete. É uma possibilidade, mas parece (só parece, não tenho dados para confirmar) que o principal motivo para a diminuição da demanda seja mesmo a recessão.

Pois bem: se a premissa é válida e as hipóteses acima descritas são verdadeiras (aumento da oferta e diminuição da demanda por conta da recessão), congelar ou diminuir preços dos insumos não resolverá o problema fundamental do setor: excesso de oferta. Seria o mesmo que achar que o desemprego seria eliminado se congelássemos todos os preços.

Os aumentos recentes dos preços dos combustíveis foi somente o estopim de uma situação que provavelmente já vinha de muito tempo. A insatisfação dos caminhoneiros é a mesma de muitos brasileiros: o alto desemprego, causado pela mais brutal recessão da história.

Não será baixando o preço dos combustíveis que se resolverá este problema. Pelo contrário: ao adotar medidas que ameaçam o equilíbrio fiscal, o governo somente agrava o problema estrutural.

Em resumo: nada do que o governo possa fazer no curto prazo vai resolver a vida dos caminhoneiros. Portanto, o país continuará refém de um impasse sem solução.

Como funciona uma empresa?

O presidente do Senado, Eunicio Oliveira, disse que, entre “Parentes” e consumidores, ele fica com os consumidores. É sua forma de dizer que a Petrobras deveria vender combustíveis subsidiados, incorrendo em prejuízo.

Eunício Oliveira é empresário. Suas empresas lhe permitem ostentar o título de 2o senador mais rico da República, em uma competição nada fácil. Não lhe ocorre certamente que o governo possa ter ingerência sobre os preços que pratica em suas empresas (muitas das quais, inclusive, com polpudos contratos com o governo, mas não é este o tema deste post).

Mas a Petrobras é diferente. A Petrobras é do povo. Então o povo, na figura de seus representantes eleitos, deveria ter poder para influenciar os preços praticados pela estatal.

Este raciocínio, que parece lógico, tem, no entanto, duas falhas importantes: a remuneração do capital e a explicitação do conflito distributivo pelas vias corretas.

Sobre a remuneração do capital: toda empresa compete por capitais escassos para viabilizar suas atividades. Para atrair esses capitais, a empresa deve remunerá-los proporcionalmente ao risco de sua atividade. Senão, como sabe qualquer empresário, é melhor deixar o dinheiro aplicado em títulos públicos.

Esta remuneração é o lucro da empresa. Sem lucro, não há financiamento para as atividades da empresa. E não é qualquer lucro. Precisa ser um lucro que remunere o risco. Inclusive o risco de que entre uma nova diretoria e se submeta ao arbítrio do dono da empresa. No caso da Petrobrás, o governante de plantão.

A Petrobrás precisa de sócios. O Estado brasileiro não tem recursos suficientes para bancar todo o capital necessário para financiar as atividades da empresa. E, não custa lembrar, perfurar poços em busca de petróleo está longe de ser uma atividade isenta de riscos. Para atrair estes sócios, é necessário que a empresa remunere adequadamente o capital. Caso contrário, será obrigada a diminuir seu ritmo de atividades ou até, no limite, fechar suas portas.

Claro, sempre alguém poderá dizer: basta que o governo feche o capital da empresa e banque sozinho os investimentos necessários. Desta forma, ficaria sozinho com os lucros, e poderia decidir mais livremente qual o seu nível adequado. Poderia, inclusive, decidir por não ter lucro em situações como a que estamos vivendo, em que a combinação explosiva de dólar valorizado e preço do petróleo nas alturas está levando os preços dos combustíveis a níveis insuportáveis. Este é o modelo de empresa que Eunício Oliveira e boa parte dos brasileiros quer. Afinal, se não é para isto, para que serve então uma estatal?

Aqui entra o problema dos canais adequados para resolver conflitos distributivos, a segunda falha grave no raciocínio inicial.

Produzir lucros abaixo do custo de capital em estatais significa, no longo prazo, alocar recursos do orçamento público para determinados fins sem necessariamente vota-los no Congresso. Aquele dinheiro, mais cedo ou mais tarde, terá que ser reposto, e sairá do bolso dos contribuintes. Ou seja, os balanços das empresas estatais funcionam como “orçamentos paralelos”, em que as decisões de alocação de recursos passam ao largo dos debates no Congresso.

Ao exigir que a Petrobras subsidie os combustíveis, Eunício Oliveira está fazendo uma escolha orçamentária: aquele dinheiro usado para tornar os combustíveis mais baratos deverá ser subtraído de outras necessidades. Mas isto não fica claro para todos os envolvidos, pois fica lá escondido no balanço da Petrobras até que a necessidade de nova capitalização torna clara a escolha que foi feita lá atrás. Estamos vendo este fenômeno agora, nas várias subsidiárias quebradas da Eletrobrás.

Hoje, sob o comando de Pedro Parente, a Petrobras está procurando recuperar sua capacidade de investimento, detonada por pessoas como Eunício Oliveira, que não adotaria em suas empresas os mesmos princípios que quer impor à Petrobras.