A política como ela é

Matéria interessante do Estadão nos conta que o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, que sucedeu ao falecido Bruno Covas, é o campeão absoluto de propostas aprovadas pelo legislativo, incluindo o espinhoso tema da previdência dos funcionários municipais.

A explicação dada pelo jornal: ele mesmo sendo um ex-vereador, conhece como ninguém os meandros da casa. Sabe, portanto, identificar o que cada vereador precisa para votar com conforto cada matéria. Fez-me lembrar a presidência de Michel Temer, que teve uma produção legislativa assombrosa para os seus pouco mais de dois anos de mandato.

Achei graça do depoimento de uma vereadora do PSOL, que chamou de antidemocrática a velocidade com que os projetos são discutidos e aprovados na casa. Não sei porque, lembrei da final do mundial entre o meu Santos e o Barcelona. Imaginei uma entrevista do Durval, zagueirão do Santos naquele jogo, reclamando da velocidade do Messi e companhia e chamando aquilo de “anti-jogo”.

O fato é que Ricardo Nunes tem uma base parlamentar e coordena essa base junto com o líder do governo na Câmara, Milton Leite. Bate o bumbo na direção em que quer que as coisas andem e as coisas andam.

O interessante é que nem a vereadora do PSOL e nem um outro vereador do PT também entrevistado na reportagem acusam o governo de corromperem os vereadores para aprovarem assuntos de seu interesse. O que parece existir são as trocas naturais dentro de qualquer processo democrático. Para alguns, essas trocas necessariamente envolvem corrupção e o sistema político em uma democracia representativa está irremediavelmente perdido. A única solução seria a antipolítica, representada por um líder virtuoso e incorruptível, que governaria em ligação direta com o povo. No entanto, parece-me que essa “solução” já foi tentada em vários lugares e ocasiões sem muito sucesso. Por outro lado, a limitada e cheia de defeitos democracia representativa é o sistema que prevalece nos países de maior sucesso material. Talvez o que esteja em falta sejam líderes políticos que saibam manejar a máquina. Ricardo Nunes tem demonstrado que é possível.

Quando quer, o governo bate o bumbo

A Câmara aprovou ontem o novo marco regulatório das ferrovias, que permite a construção por meio de simples autorização ao invés de concessão. Esse novo marco deve permitir o surgimento de ferrovias privadas de acordo com necessidades específicas das empresas.

O marco das ferrovias vem se juntar a outros avanços microeconômicos deste governo, como o marco do saneamento, a nova regulação do mercado de câmbio, a autonomia do Banco Central e, last but not least, a reforma da Previdência.

Sempre que critico algo que o governo não fez, como as reformas tributária e administrativa ou o ritmo pífio das privatizações, é comum alguém nos comentários tentar justificar, dizendo que o governo depende do Congresso, não dá pra fazer tudo sozinho etc.

É claro que, em um regime democrático, o presidente é limitado pelo Congresso. Mas também é verdade que, em um regime presidencialista, o presidente bate o bumbo do governo. A aprovação desse marco das ferrovias é um exemplo acabado: como o governo tinha alto interesse em sua aprovação, editou uma medida provisória para “acelerar” o processo. Funcionou.

Transferir os fracassos para a conta do Congresso supõe transferir também os sucessos. Nesse caso, o presidente faria apenas o papel de uma rainha da Inglaterra, enquanto o Congresso governaria de fato. Sabemos que não é assim no regime presidencialista brasileiro. Não à toa, Bolsonaro não demorou a desistir da historinha da “nova política”.

Parabéns ao governo pela aprovação de mais esse marco importante para aumentar a produtividade da economia brasileira. Uma pena que não tenha havido o mesmo empenho para avançar as reformas tributária e administrativa, que levariam o país a outro patamar.

A política corporativista

São cerca de 1,3 milhão de funcionários públicos na esfera federal, que consomem mais de R$ 300 bilhões/ano, nesta que é a segunda maior despesa da União, depois da Previdência Social.

O destemido Bolsonaro arregou diante dessa turma sem nem mesmo ter entrado no ringue. Entendo toda a dificuldade política que envolve o assunto. Afinal, o poder de pressão do funcionalismo sobre os congressistas é maior do que o poder de pressão dos seus eleitores, para quem não dão a mínima bola.

Mas Bolsonaro veio implementar a “nova política” (faz tempo que não ouço essa expressão, por que será?). Sua relação com o Congresso se daria através de iniciativas programáticas, sem o “toma-lá-dá-cá” que caracterizava o presidencialismo de coalizão. Então, por que simplesmente não mandar o projeto para o Congresso? Não era esse o programa do governo? Fosse a “velha política”, o presidente contaria com uma base de sustentação no Congresso, e amarraria a votação de seus projetos. Na “nova política”, eu esperaria que, pelo menos, o abacaxi fosse jogado para os parlamentares, que teriam o ônus de dizer não a um projeto mais do que popular. Mas, por algum misterioso motivo, Bolsonaro, a expressão máxima da “nova política”, não quer se indispor com o Congresso. Ou seja, não temos nem a “velha política” e nem a “nova política”. Não temos política nenhuma.

Enquanto isso, o funcionalismo público federal continua sendo um dos mais bem pagos do mundo em relação à renda per capita de seu país, enquanto continuamos a ser o país com maior carga tributária entres seus pares emergentes e, mesmo assim, não conseguimos gerar superávit nas contas. Por enquanto, o mercado está satisfeito com a reforma da previdência. Daqui a pouco, vai começar a cobrar a continuidade das reformas. Bolsonaro está brincando com fogo.

Maia não é inimigo

Trechos da entrevista hoje com Rodrigo Maia.

Maia é o presidente de Congresso que qualquer presidente com agenda liberal pediria a Deus.

– Ain, mas ele é o Botafogo da planilha da Odebrecht, bandido como todos os outros.

Bem, nesse momento ele é tão bandido quanto Flávio Rachid Bolsonaro, ou mesmo a esposa do presidente, que recebeu R$20 mil do Queiroz. Depois de 5 anos de lava-jato, não houve sequer indiciamento de Maia, quanto mais julgamento e condenação. Não estou dizendo que ele seja inocente. Só estou afirmando que, por enquanto, só existem ilações, exatamente como no caso Queiroz.

Como eu ia dizendo, Maia é o sonho de consumo de qualquer presidente liberal. Essa é a grande sorte de Bolsonaro, que inaugurou com sucesso o semi-parlamentarismo. Maia reconhece que se enganou no início do mandato, ao tentar conduzir entendimentos em torno de um clássico “presidencialismo de coalização”. Hoje o parlamento está muito mais “empoderado” (para usar uma palavra da moda), não sendo apenas um puxadinho do governo.

Ninguém vai tirar o mérito de Bolsonaro de ter sido fiel aos seus princípios, e de ter construído outra forma de relacionamento com o Congresso, abrindo voluntariamente mão de um poder que todos os outros presidentes tiveram. Só espero que os bolsonaristas sigam o exemplo do presidente e saibam reconhecer em Maia um aliado providencial, e não um inimigo.

Velha política x Nova política

Entrevista hoje com Luiz Eduardo Ramos, ministro-chefe da Secretaria de Governo, responsável pela articulação política do Planalto.

Estamos em setembro. Há coisa de 4 meses, no início da tramitação da reforma da previdência, escrevi alguns posts aqui sobre o problema da falta de uma base de sustentação do governo no Congresso. Defendia, na ocasião, que a chamada “Nova Política” não podia abrir mão de fazer política, que significa compartilhar espaços de poder. Fazer política não podia ser sinônimo de roubalheira. A construção da base poderia ser feita com base em um programa de governo. Exatamente o que o ministro diz na entrevista.

Bem, foram tantos os comentários e tantos posts na minha TL execrando o “toma-lá-da-cá”, que escrevi um último post sobre o assunto, dizendo que me havia caído uma ficha: Bolsonaro não havia sido eleito para fazer o que os outros sempre fizeram. Ele não teria uma base no Congresso em troca de cargos indicados por parlamentares.

Isso faz só 4 meses. A defesa da “Nova Política” sumiu da minha TL. Alguns poucos ainda defendem a “visão estratégica” do governo em pontos que fariam cair o mundo há 4 meses.

Dirão que a reforma da Previdência foi aprovada sem o toma-lá-da-cá. Verdade, ainda que, na minha humilde opinião, a reforma foi aprovada APESAR do Planalto, não POR CAUSA do Planalto. Mas deixemos de barato que tenha sido obra da “Nova Política”. Se funcionou com a reforma, por que mudar? Por que a preocupação em ter uma base no Congresso, conforme externado pelo ministro na entrevista? Em time que está ganhando não se mexe. Ou não está ganhando?

Enfim. Na época em que eu ainda discutia “Nova x Velha” política, fiz uma enquete sobre o que aconteceria no futuro. As alternativas eram mais ou menos as seguintes: 1) Bolsonaro se manteria firme e o Congresso não se curvaria, chegando a um impasse institucional, 2) Bolsonaro se manteria firme e o Congresso se curvaria à “Nova Política” e 3) Bolsonaro cederia à “Velha Política”. The winner is…

O início de tudo

O caso que deu início à suspensão do processo contra Flavio Bolsonaro chegou à Suprema Corte há dois anos, junho de 2017. Trata-se de uma prosaica sonegação de impostos por donos de um posto de gasolina em Americana.

Acompanhe comigo: 10 meses depois, em abril de 2018, a Corte julgou que se tratava de um caso de repercussão geral, e marcou julgamento para 11 meses depois, março de 2019. Ocorre que em março, o julgamento foi adiado para novembro, 6 meses depois. Se tudo desse certo, portanto, o recurso do casal de Americana seria julgado 2 anos e 5 meses depois de ter chegado à Corte.

Mas aí acontece a mágica: o advogado de Flávio Bolsonaro descobre que o seu cliente está sendo acusado com provas obtidas da mesma forma com que foram conseguidas as provas contra os proprietários do posto de Americana. Entra com um recurso no Supremo e… voilá, tudo suspenso. Fosse depender do curso “normal” das coisas, é possível que os anônimos de Americana morressem sem ter um veredito do Supremo Colegiado.

A Nova Política, aos trancos e barrancos, vem ganhando seu espaço no relacionamento com o Legislativo. Mas quando se trata de proteger os seus da longa mão da justiça, ainda vale a lógica da Velha Política.

Cenário se materializando

Ministério das Cidades recriado.

Cenário 2 se materializando.


Post de 23/03/2019

Cenário 1: Bolsonaro consegue impor a sua agenda com a força das ruas. 308 deputados votam a reforma da Previdência sem qualquer tipo de negociação. O pacote passa inteiro. A economia deslancha e Bolsonaro é reeleito em 2022.

Cenário 2: Bolsonaro cede e negocia cargos e pontos da reforma. A reforma passa com alguns descontos. A economia deslancha e Bolsonaro é reeleito em 2022.

Cenário 3: Bolsonaro, fiel à sua agenda, não negocia, e a reforma da Previdência não é aprovada. A economia vai para o buraco e Bolsonaro até tenta colocar a culpa no Congresso. Mas, como no Brasil, tudo é sempre culpa do presidente, Bolsonaro é derrotado em 2022. Se conseguir chegar até lá, claro.

Qual desses cenários é o mais provável?

Aceno

23:59: Sabemos que “articulação política” é um nome bonito para “roubalheira”. A velha política precisa entender que o “toma-lá-dá-cá” acabou, esse governo trabalha em outras bases. A reforma da Previdência foi enviada ao Congresso, agora os deputados devem votar pensando no Brasil.

00:00: Tudo faz parte da estratégia para aprovar a reforma da Previdência. Bolsonaro sabe o que está fazendo, ele é muito esperto.

Fake news or not fake news: that’s the question

São mais de R$ 8 milhões/ano gastos em altíssimos salários para apadrinhados de políticos, em um órgão que produz virtualmente zero para a população de São Paulo.

Sim, estou furioso, e poderia parar por aqui.

Mas aí me ocorreu: o Estadão, onde a denúncia foi publicada hoje, é um jornal que publica “fake news”. Pelo menos, foi isso que aprendi no episódio da jornalista que queria “destruir” o governo Bolsonaro. Toda aquela história do Queiroz, por exemplo, foi tudo perseguição, pelo que pude ler aqui no FB.

Então, esse caso da Assembleia certamente tem muito de exagero ou má fé do jornal, certeza.

Ou não, dado que se trata da “velha politica”, que só faz coisa ruim.

Estou confuso.