“Na década de 90, aceitou algo do capitalismo mas, à diferença dos chineses, preservou o máximo de conquistas sociais. Sempre acreditou no “homem novo”, na vida sem egoísmo. Este, o seu maior mérito: não repudiou o que havia de ideais no comunismo. Sua meta estava na independência de Cuba e na justiça social; para isso incorporou o comunismo.”
Este é Renato Janine Ribeiro, hoje, no Valor Econômico. Entre ontem e hoje, li algumas análises sobre Fidel escritas por intelectuais de esquerda, para tentar entender a cabeça desse pessoal. Acho que esse trecho resume bem a coisa toda.
Eles simplesmente não ligam a miséria econômica e a ditadura feroz com a ideologia comunista. Todas as análises (e incluo aqui FHC) ressalvam o “grande ideal de Fidel”, e colocam o Estado policial e a perseguição política quase como acidentes de percurso, que não são suficientes para tisnar a Grande Obra do Homem, do Mito, do Herói.
Renato Janine e seus companheiros de ideologia não veem, ou não conseguem admitir, que a “construção do Homem Novo, solidário, sem egoísmo”, tem como instrumento necessário o estabelecimento de um Estado Totalitário. Sobre isto, recomendo a entrevista de Natan Sharansky, ontem, no Estadão. O dissidente soviético descreve com rara precisão o controle do pensamento em Estados Totalitários, único modo conhecido de implantar a Revolução do Homem Novo.
É curioso como esses intelectuais não conseguem (ou não querem) ver a contradição entre a comemoração das supostas “conquistas sociais” do regime cubano e a necessidade de “aceitar algo do capitalismo”. Ora, se as tais conquistas sociais são tudo o que o povo quer e precisa, pra que capitalismo? De onde essa necessidade de comércio e de livre iniciativa, na Sociedade do Homem Novo? Renato Janine termina seu texto perguntando se a figura de Fidel continuará inspirando aqueles que “lutam contra a miséria”! Caramba, então pra que capitalismo, se está tudo bem na ilha?
Renato Janine condena o regime chinês, “um capitalismo selvagem somado a uma ditadura, que se diz comunista mas é selvagem”. Ou seja, apesar de se dizer comunista, o regime chinês é selvagem. Aqui está, me parece, a grande desonestidade intelectual desse pessoal: se é selvagem, não é comunismo. O comunismo é virtude, e quem é contra não passa de um egoísta. A realidade das coisas é um mero detalhe para esses construtores de utopias.