A consciência da nação

Eliana Cardoso e Bolívar Lamournier, intelectuais tucanos, divulgaram um manifesto (mais um) em favor da união dos candidatos do auto-denominado “centro” em torno de apenas um nome. No caso, Alckmin.

Após 3 parágrafos conclamando a união das forças de “centro” contra as ameaças populistas e radicais de direita e de esquerda, o texto começa a analisar Bolsonaro:

“Bolsonaro segue a recente parada de populistas, de Donald Trump nos Estados Unidos a Rodrigo Duterte, nas Filipinas. Sua vitória colocaria em risco a sobrevivência da democracia no Brasil. Ele apela para a rejeição do eleitor à catástrofe produzida por Dilma-Temer. Nosso PIB por pessoa encolheu 10% em 2014-16 e dezenas de políticos estão sob investigação. Lula, preso por corrupção, consegue transferir votos para o candidato que apresenta um programa econômico catastrófico.”

Sua vitória colocaria em risco a sobrevivência da democracia no Brasil. Ponto. Os intelectuais tucanos não se dão ao trabalho de demonstrar a sua tese. Consideram-na um axioma, uma verdade que dispensa demonstração.

Além disso, a ameaça à democracia está apenas do lado de Bolsonaro. Haddad é uma ameaça à economia. Só.

Na verdade, logo à frente, há o que poderia se considerar uma sugestão de porque Bolsonaro representaria uma “ameaça à democracia”. A declaração diz o seguinte:

“O companheiro de chapa de Bolsonaro é Hamilton Mourão, um general aposentado, que no ano passado, enquanto estava de uniforme, pensou que o exército poderia intervir para resolver os problemas do Brasil. A resposta do Sr. Bolsonaro ao crime é, na verdade, matar mais criminosos.”

Até a menção à intervenção do exército, se poderia considerar que existiria o receio de um golpe militar. Mas não é disso que se trata. A conexão que os autores fazem entre intervenção e combate ao crime mostra que a preocupação está na resposta que Bolsonaro eventualmente daria à criminalidade, não a sua ameaça às instituições democráticas. Bem, nesse sentido, o exército de fato interveio, respondendo a uma ordem do governo federal. Foi na segurança pública do Rio de Janeiro, exemplo acabado de como os fofos da democracia não respondem às mais básicas necessidades da população.

O manifesto continua assim: “Para os brasileiros desesperados por se verem livres de traficantes de drogas, assassinos e políticos corruptos, Bolsonaro se apresenta como o anti-Lula. Se enfrentar Fernando Haddad, muitos eleitores de classe média e alta, que culpam Lula e o PT acima de tudo pelos problemas do Brasil, podem ser convencidos por suas visões autoritárias.”

Esse tucanato vive realmente em uma bolha. Não é que os eleitores serão convencidos pelas visões autoritárias de Bolsonaro. O que acontece é que esses eleitores estão apenas reagindo às visões autoritárias de Lula e do PT. A resposta “Bolsonaro” não apareceu porque o programa econômico do PT é “catastrófico”. Para isso, bastava um programa econômico “não-catastrófico”. Bolsonaro é a resposta ao autoritarismo do PT. Em momento algum o manifesto dos tucanos coloca os dois lados desta maneira. O único autoritário é Bolsonaro, o PT tem apenas um programa econômico catastrófico. Com essa leitura da realidade, não é à toa que estejam pregando no deserto.

O manifesto continua: “O senhor Bolsonaro tem poucos aliados políticos e, para governar, poderia degradar ainda mais a política.”

“Poderia degradar ainda mais a política”. Sério isso? Alguém realmente consegue imaginar degradação maior da política do que o mensalão e o petrolão??? Existe algo mais degradante do que ter um presidente do STF que nem em concurso para juiz conseguiu passar? Como é que se vai conseguir degradar ainda mais uma política comandada da cadeia?

O manifesto dos “intelectuais tucanos” termina assim: “A tarefa exige que os candidatos do centro, Alckmin, Marina, Álvaro Dias, Amoedo e Meirelles se encontrem e coloquem seus votos a favor do candidato que entre eles tem a maior chance de evitar uma tragédia. No momento este nome é Alckmin.”

E o Ciro? Não seria uma alternativa melhor para enfrentar o risco do “autoritarismo” e da “degradação da política”, representados por Bolsonaro? Ou o Ciro também é um “radical”? Se é, deveria ter sido citado no manifesto. Se não, deveria ter sido incluído entre os nomes possíveis para uma união.

E por que Alckmin? Por que não Marina? Marina está tecnicamente empatada com Alckmin. A escolha do nome de Alckmin só mostra que o que os intelectuais tucanos estão fazendo é apenas campanha eleitoral para o seu candidato. Nada contra, mas não venham se travestir de “consciência da nação”.

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