A “frente ampla” é tão real quanto um unicórnio

“Frente ampla”, assim como “terceira via”, é daquelas categorias políticas que só existem no mundo do realismo fantástico brasileiro. Alckmin no primeiro turno e Tebet no segundo tiveram a missão de embrulhar a candidatura do PT com o papel de presente chamado “frente ampla”, que teria como objetivo livrar o país das garras do anti-democrata Bolsonaro.

O que se viu na eleição, depois de conhecidos os números, foi algo bem diferente. Se a intelectualidade tupiniquim caiu no conto da “frente ampla”, o mesmo não se pode dizer do eleitor médio: apenas 1,8% de votos separou os dois candidatos no 2o turno. O que nos leva a concluir que não existiu apenas uma “frente ampla”, mas duas: a frente ampla anti-bolsonarista e a frente ampla anti-petista, que perdeu para a primeira por uma fração de votos. Por algum estranho motivo, somente a “frente” anti-bolsonarista mereceu este nome.

Lula não perde ocasião de rir na cara de quem acreditou nessa esparrela. O editorial do Estadão lamenta a fala do presidente a respeito de Maduro, afirmando que aquilo implodiria de vez a tal “frente ampla”. Só é possível implodir um edifício que existe, e Lula sabe, mais do que ninguém, que essa história de “frente ampla” é conversa para boi dormir. Ele sabe que pode sair pelado na Praça dos 3 Poderes e estuprar a primeira velhinha que encontrar pelo caminho, que os que votaram nele ainda dirão “pelo menos, é melhor do que Bolsonaro”. O mesmo vale para as barbaridades de Bolsonaro, com o sinal invertido. Não, não temos uma “frente ampla”, temos uma “polarização” entre duas frentes amplas.

Por isso, estranharia muito que Bolsonaro fosse impedido de disputar eleições. O PT perderia seu espantalho, aquele que carreia votos para a sua própria “frente ampla”. Enquanto existir Bolsonaro e bolsonaristas, Lula pode falar e fazer as barbaridades que for, seus votos estarão garantidos.

O representante do centro mostra porque o centro não existe

Entrevista com o ex-senador Tasso Jereissati. Reproduzo abaixo o início e o fim, o resto é tão irrelevante quanto a figura entrevistada.

Comecemos pelo fim. Tasso afirma que “não queremos” ocupar o lugar do bolsonarismo, mas sim, “queremos” ocupar o lugar do centro. “Queremos” quem, cara pálida? Quais forças políticas Tasso Jereissati está representando? Esta é só uma pergunta retórica, claro. O ex-senador representa um partido com passado glorioso, mas completamente irrelevante para o futuro do país. E essa entrevista só atesta essa triste realidade.

Um político que quer fazer oposição ao petismo não pode se dizer “muito surpreso” com a agenda econômica de Lula. Em que planeta estava o senhor senador enquanto o PT destruía a economia entre 2006 e 2015? “Ah, mas era legítimo esperar o Lula que governou entre 2003 e 2005”. Sim, era, para quem tem 18 anos de idade. Alguém que tem cabelos brancos e, em tese, é um político experimentado, não tinha esse direito. Na minha série “A Economia na Era PT”, demonstro que a semente do desastroso governo Dilma encontrava-se já no 2o mandato do governo Lula. De onde tiraram a ideia de que Lula voltaria 20 anos no tempo? “Ah, mas Lula teria aprendido com os erros do governo Dilma”. Que erros? O PT por acaso erra? Foi tudo culpa da queda dos preços das commodities, da Lava-Jato e do Eduardo Cunha.

O início da entrevista orna com o fim. Expressar “muita surpresa” no campo econômico encaixa-se perfeitamente com a babação de ovo a respeito da politica externa e da vacinação. Se fosse um governo responsável no campo econômico, seria nada menos que perfeito. É esse tipo de “oposição” que espera ganhar do PT em 2026?

O ex-senador tece loas à política externa do governo Lula, por conta do discurso na área ambiental. Adivinha qual o único político de expressão que condenou o atracamento de navios de guerra do Irã em porto brasileiro? Pois é. E ainda ficam espantados com o fato de Bolsonaro ter conseguido 49% dos votos.

Podem esperar sentados

Imagine uma “parcela do PIB” diante da TV no domingo, acompanhando as apurações e “percebendo que agora terá de escolher um lado da polarização”, pois a candidata em que apostaram suas fichas surpreendentemente ficou de fora do 2o turno. Não sei o que é mais patético, a “parcela do PIB” ou a reportagem.

Mas vamos ao que interessa. A verdade é que esse grupo de empresários (a reportagem cita Cândido Bracher (Itaú), Walter Schalka (Suzano), Fábio Barbosa e Pedro Passos (Natura) e Horácio Piva (Klabin)) tem alergia a Bolsonaro, mas sabe que o PT no poder é prejudicial ao ambiente econômico e, no final do dia, aos seus negócios. Estão, portanto, pedindo “uma maior definição” do programa de Lula para poderem apoiá-lo.

Na verdade, o programa de Lula está bem definido. É claro e cristalino para quem tem ouvidos de ouvir e olhos de ler. Essa historinha de pedir uma “maior definição”, na verdade, é a esperança de que Lula sinalize uma MUDANÇA de orientação. Querem votar em um candidato que não existe: um candidato fofo como Lula com o programa econômico de Bolsonaro.

A “parcela do PIB” pode puxar uma cadeira e esperar sentada. Lula não precisa “sinalizar” nada para o PIB ou para a Faria Lima para obter os 1,7 pontos percentuais de que necessita para vencer o 2o turno. Ele sabe que esses votos virão por inércia, dessa “parcela do PIB” que quer afetar virtude, mesmo às custas da economia do país. “O que importa é a democracia, a economia a gente vê depois”.

A bolsa ontem subiu mais de 5% com a eleição de um Congresso mais alinhado com as pautas de Bolsonaro e o adiamento da decisão para o 2o turno. Essa “parcela do PIB” ficou um pouco mais rica ontem. Vamos ver até que ponto serão capazes de exercitar o seu sagrado direito de dar tiro no próprio pé.

PS.: não acho que o governo Bolsonaro seja brilhante em matéria de condução da economia. Muito pelo contrário, quem lê essa página sabe que sou crítico a muitas coisas que foram feitas. Mas comparado com o PT, Bolsonaro é quase um Milton Friedman.

Rodrigo Maia, quem diria, acabou no Irajá

Há algumas semanas, li uma entrevista do consultor político Alberto Almeida, defendendo a tese de que uma terceira via, se quisesse ter alguma chance, deveria atacar Bolsonaro, para pescar os votos de anti-bolsonaristas que vão votar em Lula já no primeiro turno. Para quem não lembra, Alberto Almeida era um consultor muito requisitado pelo mercado financeiro, até que foi pego em um dos grampos de Lula, dando “conselhos” ao ex-presidente. A sua, digamos, isenção, ficou comprometida. Quando li a entrevista, pensei: “Alberto Almeida não mudou nada”.

E eis que Rodrigo Maia, o ex-todo poderoso presidente da Câmara dos deputados, faz a mesma análise: atacar Lula seria um erro, e foi por isso que a terceira via não decolou. Como desta vez a análise veio de um político experimentado, resolvi revisitar o meu ponto de vista.

Já defendi aqui várias vezes que, se um candidato quisesse ter alguma chance de chegar ao 2o turno, deveria pescar seus votos no anti-petismo, não no anti-bolsonarismo. A tese é simples: o PT está sempre no 2o turno de qualquer eleição presidencial. Foi assim desde 1989. Foi assim em 2018, com Lula preso e uma nulidade como Haddad como candidato. Portanto, seria perda de tempo tentar tirar Lula do 2o turno. O campo aberto é o do antipetismo, hoje ocupado por Bolsonaro. O anti-bolsonarismo é de ocasião, o antipetismo é orgânico.

Coincidência ou não, os dois únicos candidatos que saíram do traço estatístico nas pesquisas, Ciro e Moro, são bastante críticos ao petismo e a Lula. Rodrigo Maia crítica Ciro justamente por isso. Diz que o candidato do PDT “não chegará a lugar nenhum” fazendo isso. Bem, ele já chegou bem mais longe do que outros candidatos da “terceira via” que passaram a mão na cabeça de Lula.

Maia também diz que o candidato da “terceira via” deveria conquistar o eleitor que votou em Bolsonaro e se arrependeu. Bem, certamente não é batendo fofo em Lula que vai conquistar o eleitor bolsonarista arrependido. O que Maia descreve é um conjunto vazio, o que não deixa de ser uma explicação involuntária de porque a “terceira via” não decolou.

A nota cômica vai para o resultado desejado dessa “tática” de conjunto vazio: um candidato de “centro-direita” que isolasse a extrema direita em seu nicho. Em 2018, a “centro-direita” recebeu 7,5% dos votos, 5% de Alckmin e 2,5% de Amoedo. Não foi por falta de opções, portanto, que o antipetismo elegeu Bolsonaro. Hoje, a “centro-direita” está sentada no colo de Lula (Alckmin é seu vice!), e Maia, assim como o “consultor” Alberto Almeida, mal consegue disfarçar o seu papel de quinta-coluna do petismo. De anti-petistas na praça sobraram Bolsonaro e Ciro Gomes, não por coincidência os únicos candidatos competitivos além de Lula.

Rodrigo Maia já foi um dos grandes nomes do jogo político nacional. Neste ano, nem candidato vai ser. Veio com uma conversa de que não quer ser eleito para ficar na planície na Câmara dos Deputados. A verdade é que tem medo de não ser eleito. Rodrigo Maia, quem diria, acabou no Irajá.

Pesquisa boa para quem?

Uma pesquisa boa para a 3a via…

Na pesquisa anterior da CNT/MDA em fevereiro, o ex-juiz Sérgio Moro tinha 6,4% das intenções de voto. Nesta pesquisa, já sem Moro, a variação das intenções de voto dos candidatos foi a seguinte:

Lula: – 1,6 pp (pontos percentuais)

Bolsonaro: + 4,0 pp

Ciro: + 0,4 pp

Doria: + 1,3 pp

Tebet: + 1,7 pp

Janones: + 1,0 pp

Ou seja, Bolsonaro sozinho ganhou 4 pontos percentuais enquanto os candidatos da “terceira via” ganharam, juntos, 4,4 pp. Estes candidatos todos tiraram 1,6 pp de Lula, 0,4 pp dos indecisos e herdaram 6,4 pp de Moro.

A notícia boa para a “terceira via” seria se UM dos candidatos herdasse TODOS os votos. Não aconteceu. Aliás, quem herdou mais da metade dos votos de Moro foi Bolsonaro.

Não há novidade nenhuma aqui, apenas a confirmação do que já apontaram outras pesquisas. O que me chamou a atenção foi só a manchete, que deve ter sido escrita pelo estagiário da redação, com todo respeito aos estagiários.

Linha auxiliar de Lula

Entrevista do pré-candidato do PSDB, João Doria, ao Valor Econômico de hoje. Destaco dois trechos.

No primeiro, ao ser perguntado sobre qual seria o “diferencial” de uma candidato da chamada “terceira via”, Doria se sai com uma sopa insossa de “país liberal com preocupação social”, incluindo os temperos “educação e saúde de qualidade” que não podem faltar em todo prato de promessas políticas amorfas.

Já havia criticado aqui a entrevista de Simone Tebet, que trazia o mesmo coquetel de chuchu, e havia afirmado que a bandeira da terceira via tinha que ser a da pacificação nacional. O PT já tem a bandeira da “justiça social”, ao passo que Bolsonaro explora bem a bandeira dos “valores conservadores”. São bandeiras simples, fáceis de entender, e que mobilizam. Ficar falando que vai entregar “crescimento com distribuição de renda” não leva nenhum candidato a lugar algum. E se tem algo que uma parte do eleitorado anseia neste momento é um pouco de paz social, uma redução do clima beligerante que tomou conta do país. Não sei se essa parte do eleitorado é suficiente para dar a vitória a um candidato de terceira via, mas é a única chance de torná-lo competitivo. Doria, ao bater na tecla do “crescimento com justiça social” está tentando roubar a bandeira de Lula. Obviamente, não vai conseguir.

O segundo trecho está, de alguma forma, ligado ao primeiro. Depois de Doria tecer um rosário de críticas a Bolsonaro, o repórter lhe dá uma chance de fazer o mesmo com Lula.

Doria, ao invés de agarrar essa chance para mostrar que é verdadeiramente um candidato de terceira via, a joga pela janela, ao dizer que “respeita” Lula e “não respeita Bolsonaro”. A resposta óbvia para quem está disputando um lugar ao sol seria “sim, e continuamos sendo críticos de Lula e do PT. Não acreditamos que o PT tenha um projeto de país moderno, ainda mais liderado por um condenado da justiça”. Pronto, resposta simples e que o coloca simetricamente entre os dois polos. Afinal, terceira via não pode ser linha auxiliar de nenhum dos dois polos, senão o eleitor vota no polo, por óbvio. No caso, além de defender uma bandeira que pouco se diferencia daquela que já tem o PT como dono, Doria coloca Lula acima de Bolsonaro. Assim, será visto com desconfiança por quem prefere Bolsonaro e não ganhará um voto sequer de quem vai votar em Lula.

Um esclarecimento final: aqui não vai nenhum julgamento do que é certo ou errado, se Lula é superior a Bolsonaro ou vice-versa sob qualquer critério. Trata-se apenas de uma análise de estratégia eleitoral, tirada, obviamente, somente da minha cabeça. Posso estar equivocado, claro, mas acredito que a polarização presente é muito função dessa incompetência dos políticos da “terceira via” de fazer a leitura correta do cenário eleitoral. Coisa, aliás, que já vêm fazendo desde 2018, quando se “surpreenderam” com a vitória de Bolsonaro.

A direita já tem dono

Quem me acompanha já leu isso aqui: o PSDB precisa se colocar à direita de Lula. O conselho do neo-tucano Rodrigo Maia é só o óbvio ululante.

Maia afirma que a aproximação de FHC e outros próceres tucanos com Lula confundiu a cabeça do eleitor. Acho que ele está errado. Na verdade, essa aproximação somente confirmou o que os eleitores do PSDB já desconfiavam: o partido é linha auxiliar do PT.

Quando Doria tomou de assalto o partido, foi para colocá-lo firmemente à direita de Lula. Suas campanhas de 2016 e 2018 foram, antes de tudo, anti-PT. Esse, aliás, é um dos motivos pelos quais Doria sofre restrições dentro do partido.

Mas, como diz o outro, “muito pouco, muito tarde”. Doria e Maia têm a percepção correta, mas como Maia diz, é muito difícil colocar-se à direita do PT quando Bolsonaro já está lá. Esse movimento deveria ter ocorrido lá em 2005, no mensalão. Hoje, a bandeira anti-PT encontra-se firmemente nas mãos de Bolsonaro. E, se já é difícil convencer o eleitor de que se é tão anti-petista quanto Bolsonaro, imagine prestando a cortesia de visitar Lula.

O esforço pela irrelevância

Não sou especialista em marketing eleitoral, mas a impressão que eu tenho é que, se há uma bandeira que deveria ser empunhada por um candidato da terceira via é a bandeira da pacificação nacional. Acho que uma parte da população brasileira (não sei se o suficiente para ganhar a eleição, mas deve ser relevante) gostaria de deixar 1964 definitivamente para trás e olhar para frente.

Simone Tebet, em sua entrevista de hoje no Estadão, ao ser perguntada sobre o que seu grupo tem a oferecer ao eleitorado, escolhe preferencialmente a bandeira que já pertence a Lula: acabar com a fome, miséria, desigualdade social.

Se é para fazer isso, melhor votar no original. (Não que o original vá cumprir a promessa, é apenas uma referência à percepção do eleitorado). SImone refere-se à pacificação de forma apenas secundária, quando deveria ser a principal bandeira, aquela a ser martelada dia e noite.

Lula, que está longe de ser ingênuo, já sacou essa estratégia. Em tuíte de ontem, ele se coloca como “o pacificador”.

Claro, é uma lorota, assim como a de resolver o problema dos pobres. Mas estamos falando de percepções. E não tenha dúvida de que Lula vai querer se colocar como o adulto na sala, o que, convenhamos, não será difícil, considerando as diatribes diárias de Bolsonaro. A escolha de Alckmin como vice não tem nada a ver com programa econômico, mas com essa imagem de “governo de pacificação”.

Para piorar o que já estava ruim, ao ser perguntada se vai se opor ao programa econômico do PT, Tebet adota a saída Glória “Não Tenho Como Opinar” Pires.

Em que planeta a senadora morava nos anos em que o PT governou o Brasil? Em que ilha distante e sem internet estava quando Lula afirmou que vai acabar com o teto de gastos e a reforma trabalhista? Deixando a bandeira da pacificação nas mãos de Lula e abrindo mão da crítica mais óbvia ao PT, prevejo que a nossa “candidata da terceira via” tenha dificuldade de ultrapassar o número de votos de Marina Silva nas últimas eleições.

Confundindo simpatia com análise

Se há um pecado mortal em qualquer análise política, é o de não saber distinguir estratégia política de preferência pessoal. Uma coisa é achar isso ou aquilo dos candidatos, outra bem diferente é entender o que vai funcionar ou não para atingir determinado objetivo. Miriam Leitão cai nesse vício, ao determinar que qualquer candidatura de terceira via deveria reconhecer que Lula é superior a Bolsonaro no quesito “respeito à democracia”.

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Nem vou aqui entrar no mérito sobre a superioridade de um candidato ou outro sob qualquer aspecto. Tenho minha opinião pessoal, mas isso pouco importa para a análise. Meu ponto é apenas lógico: se o candidato é de “terceira via”, por definição deve considerar ambos os opostos como inadequadas SOB QUALQUER ASPECTO. Ao reconhecer alguma superioridade de um sobre o outro, já mostrou uma preferência que o transforma, automaticamente, em linha auxiliar de um dos polos. E, se é para votar na linha auxiliar, o eleitor ou vai escolher o polo principal ou o polo opositor, a depender de sua simpatia. FHC, ao tirar uma foto com Lula, fez mais pela campanha de Lula e de Bolsonaro do que qualquer aliado desses dois faria.

Miriam Leitão faz uma oposição atávica a Bolsonaro, o que é compreensível, dada a sua história pessoal. Isso é uma coisa. Outra coisa é dizer que qualquer candidato da terceira via deveria reconhecer a superioridade de Lula. Isso é uma rematada bobagem para quem realmente quer se colocar como alternativa. E vou além: se a estratégia do candidato é tirar Bolsonaro do segundo turno, deveria assumir uma postura anti-petista, pois este é o atributo mais importante em uma eleição polarizada. Ser anti-bolsonarista fará com que o candidato dispute votos com Lula, que é o anti-Bolsonaro da disputa. Atacar Bolsonaro esperando tirar Bolsonaro da disputa é fazer o jogo de Lula. Talvez seja esse o objetivo in pectore de Miriam Leitão.

A falta de demanda pela terceira via

Dada a largada para a análise de pesquisas eleitorais nessa página. Se você é daqueles que não acreditam em pesquisas eleitorais, não perca o seu e o meu tempo, simplesmente ignore. Aqui, como fiz em 2018, procuro entender as grandes tendências e chamar a atenção dos leitores para coisas que me chamaram a atenção.

O gráfico abaixo mostra todas as pesquisas publicadas neste ano, por ordem cronológica. Cada instituto tem sua metodologia de amostragem, então é natural que gerem resultados diferentes. Mas é possível derivar um certo padrão.

Lula lidera em todas as pesquisas, com intenções de voto entre 40% e 45%. Bolsonaro, igualmente em todas as pesquisas, segue em 2o lugar, com intenções de voto entre 25% e 30%. A menor diferença está na pesquisa da Paraná (40 x 30), enquanto todas as outras mostram distâncias maiores.

Mas é para o grupo “Outros” que eu gostaria de chamar a atenção. Em todas as pesquisas, este grupo perde de Bolsonaro. Ou seja, todos os outros candidatos não conseguem somar a intenção de voto em Bolsonaro. Fiz questão de plotar a intenção de voto estimulada, para não ter a desculpa de que o pesquisado não lembrou de algum candidato em que poderia votar. Estão todos listados, então a pessoa escolheu Lula ou Bolsonaro tendo como opção um terceiro nome na lista.

Houve um certo desalento essa semana com a chamada “terceira via”, depois da desistência fake de Dória e da desistência “no momento” de Moro. A grande premissa da terceira via é a união em torno de um único nome que pudesse desbancar um dos dois candidatos que estão na ponta, que hoje seria Bolsonaro. Ocorre que, mesmo na remotíssima possibilidade de que essa unificação ocorresse e que todos os que dizem votar em algum candidato que não Lula/Bolsonaro votassem nesse candidato único, o que as pesquisas dizem HOJE é que este candidato único não tiraria o lugar de Bolsonaro.

Para que houvesse alguma chance de a terceira via decolar, precisaríamos estar vendo, neste momento, uma maior dispersão de intenção de votos entre os candidatos, de modo que um eventual nome único não precisasse carrear 100% dos votos dos candidatos que desistissem para ocupar a 2a vaga no segundo turno, pois isso não vai acontecer.

Eliane Catanhêde termina sua coluna de hoje no Estadão com a seguinte frase: “Há uma desesperada demanda pela terceira via no eleitorado, mas as lideranças políticas são incapazaes de oferecer o produto”. Bem, não sei onde a colunista está vendo essa “demanda desesperada por uma terceira via”. O que eu estou vendo, olhando as pesquisas dos mais diversos institutos, é que o eleitor escolhe Lula ou Bolsonaro, MESMO TENDO OUTRAS OPÇÕES NO CARDÁPIO. Ou seja, a tal demanda parece ser mais um desejo do que uma realidade.

Claro, tudo sempre pode mudar, treino é treino, campanha é campanha, e o imponderável futebol clube sempre pode dar as caras. Mas o retrato de hoje do mercado eleitoral é demanda e oferta se encontrando em um ponto insuficiente para romper a polarização entre Lula e Bolsonaro.