Terceira via: uma minoria cada vez menor

Este post é continuação do de ontem, em que comentei o momentoso aperto de mão entre Lula e FHC. O artigo do professor de ciência política na Unesp, Marco Aurélio Nogueira, elabora o racional que está por trás daquela foto. (O artigo foi escrito antes da foto, claro, é só uma coincidência feliz. Muito útil, por sinal).

Destaquei o parágrafo que interessa, o penúltimo do artigo. O resto é um mambo jambo sobre “que país os brasileiros querem ter”, como se agenda do professor fosse a única virtuosa. Mas, enfim, vamos ao trecho destacado.

Depois de lamentar que estejamos em uma polarização que nos atazana desde 2018 e de que não tenhamos uma terceira via, desnuda-se o verdadeiro posicionamento político do professor, que é exatamente o mesmo de FHC: Lula é superior em tudo a Bolsonaro. O raciocínio é este: quero uma terceira via, mas entre Lula e Bolsonaro voto em Lula. Reconheço em Lula a legitimidade para comandar o país novamente. Basta “forçar” o PT ao entendimento amplo.

Antes de continuar, só uma observação sobre esta última frase. É estupefaciente que um professor titular de ciência política ainda não conheça a natureza do PT. Não precisa “forçar” o PT a nada. Na hora da eleição, o PT se entende com todo mundo, incluindo o diabo. Depois, na hora de governar, compra o Congresso para poder governar sozinho. Essa é a natureza do escorpião. Lula está doido para entrar em um “entendimento amplo”. Contanto que a hegemonia do partido seja preservada quando se tratar de governar. Fecha parênteses.

Voltemos ao ponto do “desejo” por uma terceira via, desde que o adversário não seja Bolsonaro. Note que este não é um raciocínio exclusivo dos filopetistas. Os filobolsonaristas argumentam exatamente da mesma maneira: gostaria de ter uma terceira via, mas contra o Lula, voto no Bolsonaro novamente. Até criticam Bolsonaro, mas contra Lula não há negociação. Da mesma forma, FHC até critica Lula, mas contra Bolsonaro não há negociação.

Nesse ambiente, não há como prosperar uma terceira via. Mesmo porque, entre filopetistas e filobolsonaristas, não é qualquer terceira via que serve. Nem todo filopetista votaria em Ciro Gomes no primeiro turno. Nem todo filobolsonarista votaria em João Doria no primeiro turno. O fato é que não há um nome de “terceira via” que atraia os que supostamente não gostam das duas opções.

O curioso é que, em princípio, um candidato de terceira via, no segundo turno, tem mais chance de bater Lula no lugar de Bolsonaro, e tem mais chance de bater Bolsonaro no lugar de Lula. Ou seja, se tem alguém que vai entregar o país nas mãos de Bolsonaro ou de Lula novamente são os eleitores desses dois candidatos, não aqueles que votarão em uma terceira via ou em branco no segundo turno. Será um campeonato de menor rejeição, como, aliás, é a característica do segundo turno. Tanto para os anti-bolsonaristas quanto para os anti-lulistas, seria mais inteligente levar um candidato com menor rejeição para o segundo turno. Ocorre que muito anti-bolsonarista é, na verdade, um petista enrustido (FHC e o professor da Unesp são exemplos), e muito anti-petista é, de fato, um bolsonarista enrustido. Tanto para um quanto para o outro, votar em Lula ou em Bolsonaro não é, assim, tããão ruim.

A terceira via só ganha votos de quem vai votar em branco no segundo turno. Ou seja, votos de quem realmente é anti-os dois polos. Estes são uma minoria cada vez menor.

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