A politização da medicina

Por orientação do meu cardiologista, tomo aspirina há anos para prevenir doenças cardíacas. Certamente, a sua prescrição baseou-se em rigorosos estudos científicos, que agora estão sendo revistos. Os riscos não compensariam os benefícios, segundo esses novos estudos.

Impossível não lembrar da celeuma em torno do tal “tratamento precoce”. Visto inicialmente como uma esperança de tratamento, o chamado “kit Covid” foi sendo descartado pela comunidade médica por não se ter encontrado evidências de sua eficácia que compensasse os seus riscos.

A coisa tomou uma dimensão política quando o próprio presidente levantou a bandeira do tratamento precoce. Quem não se lembra de Bolsonaro levantando uma caixinha de hidroxicloroquina como se fosse um troféu? A adoção do tratamento precoce tornou-se uma escolha política, não médica.

Imagine se Bolsonaro resolvesse levantar a bandeira da aspirina como prevenção de ataques cardíacos. A opinião pública entraria em transe, em uma discussão sem fim entre “defensores da ciência” e “negacionistas”. A politização da medicina talvez tenha sido uma das piores coisas que aconteceram nessa pandemia. A relação entre médico e paciente foi bloqueada por uma disputa política, na medida em que o próprio presidente se tornou um garoto-propaganda do tratamento precoce.

Vou conversar com meu médico e, juntos, decidiremos sobre a continuidade ou não do tratamento com aspirina. É isto o que deveria acontecer com o tal kid-Covid. O resto é política.

PS.: a coisa tomou tal proporção que eu tenho receio de que meu post seja bloqueado pelos algoritmos do FB por ter citado as palavras “tratamento precoce”, “hidroxicloroquina” e “kit-Covid”. Viraram palavras proibidas, ao contrário de, sei lá, heroína ou estupro. Sinais dos tempos.

Os belos olhos ESG

Entrevista com o superintendente geral da fundação Amazônia Sustentável e membro da Pontifícia Academia de Ciências Sociais, assessorando em questões climáticas.

A última pergunta da entrevista me chamou a atenção. Não pela resposta, protocolar, mas pela pergunta em si. As empresas estariam preparadas para “abrir mão dos lucros” pela preservação da Amazônia?

Empresas não são seres autônomos, com poder próprio de decisão. Empresas são a forma através da qual as pessoas se organizam para gerar valor para a sociedade. Por trás das empresas existem pessoas, acionistas e funcionários. Os lucros remuneram os acionistas e os salários remuneram os funcionários. Ao propor a redução dos lucros, o jornalista está propondo a redução da remuneração dos acionistas. Estariam estes preparados para abrir mão de sua remuneração?

Por dever profissional, acompanho de perto a divulgação trimestral dos resultados das empresas. Um resultado abaixo das expectativas já é motivo para a queda do preço das ações da empresa. As ações caem não porque as empresas não estejam adotando iniciativas ESG. As ações caem porque os lucros caíram.

Isso é tão mais interessante quanto maior tem sido o frisson em torno do tema. Parecem dois mundos separados: um é o da agenda ESG, toda empresa querendo aparecer como o champion do tema. Outra, é o da geração de resultados de curto prazo. Os investidores juram fidelidade à primeira agenda, mas é a segunda que guia suas decisões de investimento. Não fosse assim, os preços das ações não reagiriam aos resultados trimestrais. Na verdade, não fosse assim, relatórios trimestrais de resultados seriam absolutamente dispensáveis.

Há uma lenda urbana que afirma que empresas comprometidas com o ESG têm melhores resultados no longo prazo. Pode até ser verdade. O problema, como dizia Keynes, é que no longo prazo estaremos todos mortos. Quem milita na área de investimentos sabe que os investidores adotam o discurso do “longo prazo” até sentirem a primeira perda no curto prazo. Aí, o longo prazo que se lasque, quero meu dinheiro de volta.

Fosse eu, ao responder a pergunta do jornalista, diria o seguinte: “o problema não são as empresas, o problema são os acionistas. Você investe em ações? Estaria disposto a abrir mão de rentabilidade e investir em empresas que não dão lucro?”. São os investidores que comandam as decisões das empresas. No dia em que um fundo de ações que rende mal atrair investidores pelos seus belos olhos ESG, vou começar a acreditar que essa agenda está avançando.

Quem deveria policiar a internet?

Eu juro que não li este artigo da Economist antes de escrever o meu último, a respeito do Facebook. Chegamos à mesma conclusão: os políticos não põem o pé no pantanoso terreno da censura na Internet e “simulam estarrecimento” (nas palavras da Economist) e “patrocinam sessões bombásticas no Congresso” (nas palavras do meu artigo) a respeito da falta de ação das redes sociais.

O fato é que fazer censura (e é disso que se trata, por mais feia que seja a palavra) vai contra a própria essência da democracia. É óbvio que há conteúdos que não deveriam estar circulando por aí. A quadratura do círculo é justamente quem define, e com quais critérios, o que não deveria estar circulando por aí. No entanto, uma coisa é certa: se alguém deveria realizar essa tarefa, não deveriam ser empresas privadas, com critérios pouco transparentes. Só estão agindo, segundo a Economist, por omissão do poder público.

E se é o poder público que deveria censurar as redes, fica a questão: um poder público que censura conteúdos poderia ainda ser considerado democrático? Antes de responder, outra questão: pode uma democracia censurar conteúdos em nome da preservação do regime democrático?

A esquerda não está rachada

“A esquerda está rachada”.

Não, meus amigos. A esquerda não está rachada. A esquerda está bem unida em torno de Lula. Até o PSOL, que sempre tem candidato à presidência, deve abrir mão de candidatura própria para apoiar o ex-presidiário.

Ciro, com o apoio inestimável do mago das eleições João Santana, sabe que a única via possível para chegar ao 2o turno é a via do anti-petismo. Até o momento, esse lugar era ocupado soberanamente por Bolsonaro. O pessoal precisa pegar senha para entrar na fila para bater em Bolsonaro. Mas, para bater em Lula, tratado como um estadista por todos os candidatos da “terceira via”, Bolsonaro estava sozinho. Estava.

A bem da verdade, esse posicionamento já vinha sendo construído desde o “Lula está preso, babaca!” de Cid Gomes na eleição de 2018. Foi reforçado pela “fuga para Paris” de Ciro no 2o turno e, desde então, vem num crescendo. Mas o que antes parecia ser uma vingança pessoal, agora toma ares de estratégia eleitoral.

Ciro não está batendo em Lula para tomar os votos dos petistas. Estes estão fechados com Lula. Ciro está batendo em Lula para tomar o voto dos anti-petistas, que hoje estão com Bolsonaro em um eventual 2o turno. Existe uma massa de eleitores arrependidos de Bolsonaro, mas que não deixaram de ser antipetistas. É essa massa que está sendo desprezada por todos os outros candidatos e que Ciro quer conquistar.

Last but not least, bastou Lula abrir a boca pra tropeçar na língua, chamando todos os que pegaram Covid de lesados do cérebro. Ciro teve a virtude de tirar Lula da toca, e seus pontos fracos começam a aparecer. Os outros candidatos da “terceira via” vão esperar quanto tempo para fazer o mesmo?

A função social dos empresários

Príncipe William dá lição de moral em Jeff Bezos e Elon Musk.

Outro dia (publiquei aqui), Lula escreveu o texto que acompanhou a indicação da empresária Luiza Trajano como uma das 100 personalidades mais influentes da revista Time. Lá pelas tantas, o ex-presidente saca o elogio máximo: Luiza não é desses empresários que queimam dinheiro em brinquedos espaciais. Não! Ela tem consciência social.

Príncipe William e Lula podem se dar as mãos. Ambos sabem melhor do que Bezos e Musk onde eles devem aplicar o seu dinheiro. Os dois estão entre os caras mais ricos do mundo, mas é o príncipe e o ex-presidiário que determinam onde é moralmente permitido investir.

Desde a década de 60, sabemos que o investimento em viagens espaciais têm relevância em muitas outras áreas. A tecnologia desenvolvida para levar um foguete até a órbita da Terra é usada em muitas outras atividades.

Além disso, o princípio da diversificação dos investimentos sugere que alguns empresários investirem em viagens espaciais é saudável. Afinal, pode ser que os investimentos para tornar a Terra habitável falhem, então é melhor ter um plano B. Se ninguém investir em viagens espaciais, lá na frente pode fazer falta.

Mas esses argumentos, apesar de importantes, são secundários. O principal é que ninguém designou príncipe William ou Lula como juízes morais dos investimentos de ninguém. Quem são eles para julgarem como Bezos, Musk ou qualquer outro empresário gera valor para a humanidade? Por trás desse julgamento há uma mal disfarçada ojeriza à atividade empresarial, que somente pode ser perdoada se cumprir uma “função social”. Função social esta, claro, definida pelos oráculos do bem, como príncipe William e Lula.

Claro que Jeff Bezos e Elon Musk estão C&A para o que pensam o príncipe e o plebeu. Ainda bem.

Notícias boas e verdadeiras

Lauro Jardim nos faz saber que Haddad se reuniu com alguns empresários em São Paulo. Empresário, como sabemos, é um bicho pragmático. Pode até ter suas opiniões, mas prepara seus negócios para qualquer cenário. E um cenário possível é a volta de Lula ao poder.

Alguém anotou as “contribuições” de Haddad para o esclarecimento dos empresários e repassou-os ao jornalista.

Comento cada uma a seguir.

1) “O PT não é um partido de esquerda, mas de centro-esquerda.

”O PT quer ocupar o lugar do “centro”, aquele que não faz mal a ninguém. De fato, visto do PSTU, o PT é um partido de centro-esquerda. O problema é que, visto do centro, o PT é de esquerda mesmo.

2) “A culpa é da Dilma”

Já escrevi aqui que Dilma colheu o que Lula plantou. Na verdade, deu azar, porque a farra das commodities foi acabar justo no seu governo. Sem dinheiro para sustentar os gastos mastodônticos patrocinados desde o governo Lula, foi a pique. Mas ela não está sozinha nessa. Aliás, vemos que Haddad concorda com o Ciro.

3) “A grande vingança do Lula será fazer o Brasil crescer novamente”

A fala é uma bobagem, mas é interessante o tema da “vingança” aparecer na conversa. Há uma sensação ruim de que Lula de volta ao poder não deixará pedra sobre pedra. Mas pode ser só uma sensação ruim.

4) “Lula não sabia da corrupção na Petrobras.”

O esquema era 1/3 para o PT, 1/3 para o PMDB e 1/3 para o PP. Mas Lula não sabia de nada.

5) “Autonomia do BC, não”

Finalmente uma verdade. Parece aquela piada: “trago notícias boas e notícias verdadeiras. O problema é que as boas não são verdadeiras e as verdadeiras não são boas”.

É dura a vida do Haddad.

Facebook, a empresa que todos amam odiar

Temos acompanhado nos últimos dias mais uma onda de críticas ao Facebook e a seu fundador e CEO, Mark Zuckerberg. Desta vez, o pivô da indignação foi o testemunho de uma ex-funcionária da empresa, Frances Haugen, diante do Senado americano. Segundo a delatora (assim a tem chamado a imprensa em geral), o Facebook teria escondido resultados de pesquisas internas que teriam apontado a “toxicidade” de seus algoritmos, ao promover “discursos de ódio, intolerância e desinformação”. Tudo isso em nome do lucro acima de tudo. Além disso, outra pesquisa interna teria evidenciado o efeito deletério em adolescentes, especialmente meninas, de outro produto da empresa, o Instagram. E, como sempre, a alta direção não teria feito nada para mitigar os danos, sempre de olho no lucro.

O Facebook já foi acusado de muitas coisas. A primeira onda de críticas se referiu ao uso de dados dos usuários e à quebra de sua privacidade. Em seguida, o foco foi deslocado para outros dois problemas, expostos no depoimento de Frances Haugen: a falta de moderação do conteúdo e os algoritmos que visam aumentar o engajamento. Esta trinca (uso de dados dos usuários, algoritmos de engajamento e conteúdos impróprios) penso que resume todas as críticas à empresa. Vejamos cada uma delas.

Sou um usuário do Facebook e não pago nada por isso. Assim como os telespectadores de canais da TV aberta, os usuários do aplicativo “pagam” pelo seu uso através da exposição à propaganda. A diferença do Facebook para a TV aberta é a eficiência no direcionamento da propaganda: a empresa de Zuckerberg consegue, a partir dos dados de seus usuários, dirigir os anúncios de maneira mais focada. A TV aberta também segmenta os seus diversos públicos, como bem sabe qualquer agência de publicidade. Mas o acesso aos dados dos seus usuários é mais limitado. A diferença não é conceitual, mas de intensidade. De qualquer forma, alguns simplesmente não se conformam com o fato de que as pessoas estejam dispostas voluntariamente a expor seus dados pessoais em troca do uso da plataforma. Caso contrário, o Facebook e seus irmãos menores não teriam mais de 3 bilhões de usuários. A empresa poderia lançar uma versão “premium”, em que o usuário pagasse para não ter propaganda em sua tela. Desconfio de que poucos estariam dispostos a pagar por isso.

Os algoritmos de engajamento talvez sejam a acusação mais tenebrosa feita contra o Facebook e todas as outras empresas de tecnologia que vivem de tráfego em seus aplicativos. “Algoritmos” remetem ao conceito de manipulação, algo por trás das cortinas que nos leva a fazer coisas que não faríamos se não fôssemos levados a tal. Seríamos, assim, meras marionetes dos algoritmos. O que dizer? Em primeiro lugar, toda empresa, do mundo virtual ou real, procura engajar seus clientes. As vitrines das lojas nos convidam a entrar, distribuidores de panfletos convidam para lançamentos imobiliários, supermercados fazem promoções. Engajar, portanto, não é um crime em si. A diferença do Facebook e seus congêneres seria a “falta de transparência”. Ninguém sabe realmente como funcionam os tais algoritmos, o que aparece ou deixa de aparecer na linha do tempo do aplicativo. A pergunta é: o que mudaria se os algoritmos fossem públicos? Haveria uma “agência reguladora” de algoritmos? Quais seriam os critérios de um bom algoritmo? Não parece ser um problema fácil de resolver, se é que existe um problema aqui.

Este problema “do que fazer” nos leva à terceira crítica: a moderação de conteúdos. Em 30/03/2019, Mark Zuckerberg publicou artigo no Washington Post afirmando que “eu não pediria que as empresas fizessem esse julgamento (sobre conteúdos impróprios) sozinhas. Acredito que precisamos de um papel mais ativo dos governos e reguladores (neste campo)”. Zuckerberg, espertamente, jogou o abacaxi de censurar conteúdos no colo dos reguladores. Obviamente, depois de mais de dois anos, nada aconteceu. Os políticos continuam patrocinando sessões bombásticas no Congresso, mas o problema tóxico de eliminar conteúdos impróprios continua sendo do Facebook, uma empresa privada, não custa lembrar. É óbvio que postagens que contenham crimes tipificados, como estelionato e incitação à violência física, são inaceitáveis. O problema começa quando se desce para definições do que seja “discurso de ódio” e “intolerância”, ou, pior ainda, o que seriam posições políticas aceitáveis. O curioso é que há muitos que reclamam do excesso, e não da falta, de intervenção do Facebook nos conteúdos postados, desconfiando até que Zuckerberg teria uma agenda oculta. Censura é sempre um assunto muito delicado.

O frisson que mais uma vez tomou conta do debate público passa ao largo da vida real. Nesta, as ações do Facebook estão próximas de sua máxima histórica, indicando que, para os investidores, esses debates não devem influenciar o futuro da empresa. A julgar pela reação dos usuários à instabilidade que tirou do ar a trinca de aplicativos de Mark Zuckerberg por algumas horas na semana passada, os investidores provavelmente estão corretos.

Quem vai pagar a conta?

Rindo até 2100, quando o planeta estará 3oC mais quente e o mundo tal qual o conhecemos terá acabado.

A capa da Economist traz, para quem acompanha esta página, exatamente o que venho falando aqui nos últimos anos.

Copiando e colando o início da reportagem:

Since May the price of a basket of oil, coal and gas has soared by 95%. American petrol prices have hit $3 a gallon. Blackouts have engulfed China and India. Britain has turned its coal-fired power stations back on. And Vladimir Putin has just reminded Europe that its supply of fuel relies on Russian goodwill. The panic is testament to how much modern life depends on abundant energy: without it, bills become unaffordable, homes freeze and businesses stall.”

Vou traduzir a última frase, que é chave: “O pânico atesta o quanto a vida moderna depende de energia abundante: sem ela, as contas se tornam impagáveis, as casas congelam e os negócios param”.

Venho chamando a atenção para a impossibilidade prática de transformar a matriz energética sem mudar uma vírgula de nosso estilo de vida. O (triste) fato é que a energia limpa é mais cara que a energia suja, por ser intermitente. Se fosse mais barata, não seriam necessários congressos e mais congressos sobre o clima. Não houve congressos para a substituição das carroças pelos automóveis, nem da máquina de escrever pelo computador. A tecnologia melhor naturalmente substitui a pior. No caso, a energia limpa é economicamente pior que a suja. Claro, sempre se pode dizer que a energia suja é mais cara se forem considerados seus efeitos sobre o clima, mas o seu custo não está sendo corretamente precificado. Pois então, a reportagem da Economist é sobre isso: começamos a precificar corretamente a energia suja. O resultado é o aumento brutal dos preços, afetando a atividade econômica. Um mundo de energia limpa é um mundo mais pobre, pois gastamos mais com energia. Um mundo com uma qualidade de vida pior.

Governos se reúnem em congressos, de onde tiram metas ambiciosas de redução de gases de efeito estufa. Investidores pressionam empresas para que assumam a sua parte nesse bom propósito. No entanto, ninguém ainda teve a coragem de contar para o distinto público que tudo isso significa mais inflação e menos crescimento econômico. Estamos agora todos “descobrindo” isso, e não acho que a maioria esteja gostando do que está vendo.

Aos espíritos mais sensíveis, explico que minha risada que abriu esse post não é, de maneira alguma, de escárnio. Trata-se apenas de uma reação a uma certa ingenuidade que parece perpassar toda essa discussão, como se houvesse um pequeno grupo de governos e empresas muito maus que estivessem segurando as mudanças que beneficiariam a maior parte da humanidade. Estamos descobrindo, horrorizados, que é a maior parte da humanidade que vai pagar a conta da transição.

Onde estaria Renan?

Este post é complemento do anterior.

O ex-presidente da Braskem foi condenado nos EUA. Terá que passar quase 2 anos no xilindró, e ainda pagar multa milionária. Sem direito a embargos infringentes dos embargos de declaração na enésima instância da justiça.

Enquanto o executivo encontrava-se no Brasil, nada lhe aconteceu. Foi colocar os pés nos EUA no final de 2019, para onde foi em viagem de férias, para ser detido e sujeito a processo, que corria em segredo de justiça.

Fico imaginando onde estaria um político como Renan Calheiros se fosse nos EUA.

Renan repaginado

Em qualquer lugar do mundo civilizado, uma figura como a do senador Renan Calheiros já estaria relegado há muito tempo ao mais profundo ostracismo. Mais precisamente, desde 2007, quando renunciou à presidência do senado para evitar a cassação por seus pares.

No entanto, no Brasil, Renan está por aí, dando as cartas, como um interlocutor político legítimo. Inclusive, segundo a notinha do jornal, Renan teria sido “repaginado” pela CPI.

O jornalista, para escrever isso, deve entender muito de política. Eu, na minha invencível ignorância, penso o contrário: essa CPI nasceu com um vício de origem chamado Renan Calheiros. Simplesmente não dá para levar a sério uma comissão de inquérito que tenha Renan como relator. Tanta gente com uma folha corrida menos, digamos, polêmica, e os senadores da oposição não conseguiram escolher ninguém melhor que Renan Calheiros. Chego a pensar que foi tática de algum senador governista para minar a credibilidade da CPI.

Não deveríamos estar surpresos. Em um país onde um político com condenação confirmada em três instâncias da justiça é tratado como um player normal do jogo político e até como um estadista, Renan Calheiros é café pequeno. No fim, a mesma inteligentzia tupiniquim que acha tudo isso muito normal, rasga as vestes diante das “injustiças” brasileiras. Vai vendo.