A solução para a crise climática é sempre dos outros

O colunista do Washington Post está preocupado com o aquecimento global, e sugere uma série de medidas práticas que poderiam desacelerar imediatamente o processo. Sua tese é de que, ao focar em “energias alternativas” que não existem hoje, estaríamos perdendo um tempo precioso. No caso, o ótimo seria inimigo do bom, e estaríamos em melhores condições com medidas simples. As medidas propostas por Zakaria são as seguintes (mesmo não sendo colunista famoso de jornal famoso, comento cada uma delas em seguida):

1. Conversão de usinas termelétricas a carvão para gás natural. Segundo Zakaria, o gás natural emite metade do dióxido de carbono do carvão.

Meu comentário: gás natural tem um problema: é preciso construir gasodutos até a usina. Ou liquefazer para o transporte via terrestre, e regaseificar em uma unidade própria para isso. Ou seja, é necessário algum investimento. Fora a questão do custo, há o problema geopolítico. A Europa, que voltou a usar carvão, que o diga.

2. ”Regulações inteligentes e rígidas” que deem uma solução técnica para a produção de metano na agricultura, em aterros sanitários e, vejam só, na extração do gás natural, a solução apontada no item acima.

Meu comentário: não há o que comentar quando a sugestão se reduz a “regulações inteligentes e rígidas”.

3. Reativação e construção de usinas nucleares.

Meu comentário: essa sim é uma solução estrutural. Zakaria diz que “devemos continuar trabalhando em novos projetos de reatores menos propensos a derretimentos”. Ok, mas a julgar pelas suas próprias palavras no início, não devemos esperar o ótimo para implementar o bom. Energia nuclear já! Claro que Zakaria, assim como cada um de nós, provavelmente não se vê morando ao lado de uma usina nuclear. Afinal, o problema da energia precisa ser resolvido, desde que o risco fique longe.

4. Plantar 1 trilhão de árvores. Parece que essa é a ideia de um par da Greta, o menino Félix Finkbeiner. Aos 9 anos, o “jovem ambientalista” (na definição de Zakaria) propôs que cada país plantasse 1 milhão de árvores e, aos 13, propôs na ONU o plantio de 1 trilhão de árvores no mundo inteiro.

Meu comentário: Eu realmente fico curioso como se dão esses processos midiáticos em que alguém tem uma ideia qualquer, mas que se transforma em algo repercutido por um colunista do Washington Post. Se cada árvore ocupar um metro quadrado, estamos falando de uma área equivalente ao Egito somente em árvores. Ou, de outra forma, são 1.250 árvores por habitante do planeta. Fica o desafio de encontrar essa área ADICIONAL que não sejam desertos quentes ou gelados, ou não sejam usados para agricultura, ou não estejam ocupados por cidades. Boa sorte.

É a isso que se resume “as soluções para reverter a crise climática”.

Meu comentário final: Zakaria começa seu artigo afirmando que o grande risco do aquecimento global é a fome nos trópicos e, por consequência, grandes fluxos migratórios para as regiões temperadas, EUA e Europa. Ou seja, Zakaria não esconde que sua preocupação é com um bando de famélicos batendo à porta de seu confortável apartamento, aquecido no inverno e refrigerado no verão com a energia que está aquecendo o planeta. Em nenhum momento de seu artigo Zakaria sugere algo que mude o seu próprio conforto. A solução está sempre “fora”, em algo que “os outros” poderiam estar fazendo e não estão. E, ironia das ironias, combater o aquecimento global tem como objetivo que hordas de pobres não venham atrapalhar o seu próprio conforto, que é, em última análise, o que vai provocar a corrente migratória.

Com o perdão da palavra, estou de saco cheio desses “ambientalistas” que não abrem mão do conforto que o aquecimento global lhes proporciona.

PS.: não vou entrar no mérito sobre quanto a ação humana é ou não responsável pelas mudanças climáticas. Meu objetivo foi só apontar a contradição.

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