Anatomia da área econômica do governo Lula

A senadora Simone Tebet será a ministra do Planejamento. Estava aguardando a indicação para este posto para fazer uma análise mais abrangente do ministério de Lula na área econômica. Ao contrário do governo Bolsonaro, que tinha apenas Paulo Guedes como Posto Ipiranga da economia, Lula desmembrou o ministério da economia em quatro pastas. Este desmembramento, os nomes que foram escolhidos e a forma com que foram escolhidos nos dão algumas pistas sobre o que o novo governo pretende na área econômica.

Comecemos com o ministério da Fazenda. Vários nomes circularam no mercado, desde Henrique Meirelles (que entregou o seu curriculum ao presidente em evento de apoio à sua candidatura), passando por Pérsio Arida (que foi convidado por Alckmin para fazer parte da equipe de transição), até políticos, como Rui Costa, Wellington Dias ou Alexandre Padilha, que seriam tão pragmáticos quanto foi Antônio Palocci no primeiro mandato Lula. No final, Lula escolheu o seu mais fiel escudeiro, Fernando Haddad.

Não é a primeira vez que Haddad é escolhido por Lula. O ex-prefeito de São Paulo foi escalado para ser o candidato a presidente em 2018 no seu próprio lugar. Não é pouca coisa. Lula não o teria escolhido se não visse nele o seu sucessor. A Fazenda é o ministério que pode projetar Haddad, assim como aconteceu com FHC e poderia ter acontecido com Palocci, não tivesse caído em desgraça. Mas, fundamentalmente, Lula tem um aliado incondicional no ministério, um tarefeiro sem ambições políticas próprias. Fará o que o mestre mandar.

Ainda que a política econômica seja de Lula, não passou despercebida a equipe montada por Haddad no ministério, em que despontam Gabriel Galípolo e Guilherme Mello, dois expoentes do desenvolvimentismo. Para aqueles que poderiam esperar alguma moderação por parte do novo ministro, não são sinais encorajadores.

Passando para a Indústria e Comércio, a primeira pasta desmembrada da Economia, temos Geraldo Alckmin. Parece ser uma boa escolha, dado ter sido um governador, de modo geral, responsável. O problema, no entanto, foi o processo de nomeação. Antes de Alckmin, dois empresários foram convidados para o mesmo posto e não aceitaram, aparentemente por não concordarem com a direção geral da economia do novo governo. Além disso, teriam o BNDES debaixo de sua estrutura, mas com Mercadante como presidente. Certamente, seria só no papel. O vice-presidente sempre foi um coringa nesse ministério, e Lula resolveu usar essa carta, provavelmente receando ouvir outros “nãos”. A presença de Alckmin aqui, portanto, não significa nada.

O próximo ministério é o da Gestão, desmembrado do Planejamento. Para este novo ministério foi designada Esther Dweck, desenvolvimentista de quatro costados. Apesar de não estar em uma área diretamente ligada a políticas econômicas, sua presença na Esplanada pesa no prato dos heterodoxos, nesse suposto governo “frente ampla”.

Por fim, o Planejamento. Aqui rodaram nomes como o do ex-governador de Alagoas, Calheiros Filho, e o do “pai do Plano Real”, André Lara Resende. Calheiros seria uma espécie de pagamento pelo apoio incondicional de Renan pai a Lula, mas deve ter sido vetado por Arthur Lira durante as negociações da PEC da gastança. André Lara seria mais um heterodoxo na Esplanada, ao gosto de Lula, mas, por algum motivo, recusou o convite. A vaga sobrou para acomodar Simone Tebet, depois de ter sido preterida para os postos do ministério do Bolsa Família, que ficou com Wellington Dias, e do Meio Ambiente, que ficou com Marina Silva. Ou seja, o Planejamento serviu para a acomodação de uma aliada inconveniente.

Alguns podem ver a presença de Tebet na Esplanada como o único contraponto a políticas doidivanas (Alckmin não conta, quem vai mandar ali é o Mercadante). O problema é que Tebet não é, ela mesma, campeã de ortodoxia. No ranking dos políticos, que analisa os parlamentares de acordo com seus pendores liberais, a senadora tem pontuação mediana. Mas este não é o principal problema. A questão é que Tebet terá vida curta nesse ministério se começar a causar problemas para a, digamos, harmonia da equipe. Consta que Lula já não gostou de algumas críticas que a senadora teria feito às suas falas sobre disciplina fiscal. Imagine quando atos concretos forem realizados. Enfim, Simone Tebet é uma ministra improvisada em um ministério esvaziado, que terá pouco poder para contrabalançar a avalanche desenvolvimentista contratada.

Resumindo: das quatro pastas derivadas da Economia, duas estão nas mãos de heterodoxos convictos, uma está na mão de um coringa que vai ter o Mercadante como subordinado e uma serviu como prêmio de consolação para uma aliada, depois de o candidato heterodoxo preferido ter recusado o convite. A aposta agora é: desses quatro, quantos chegam ao final do mandato?

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