Reforma política para quem, cara pálida?

Lula está enfrentando dificuldades no Congresso. A solução? Uma reforma política! É o que propõe a sempre criativa Eliane Cantanhêde, que não desiste de suas ideias, mesmo depois de ter protagonizado o mais épico “cala boca, Magda!” da história da imprensa brasileira, ao sugerir que Lula deveria assumir uma candidatura de vice-presidente da República.

Curioso que a mesma Cantanhêde via no Congresso um muro de contenção aos arroubos autoritários do governo Bolsonaro. Esse mesmo Congresso, agora, está atrapalhando a vida de Lula. Questão de perspectiva.

Uma reforma política é ruim? De maneira alguma! Estamos precisando de uma para ontem, de modo a melhorar a representatividade dos congressistas, principalmente com a adoção do voto distrital. No entanto, o problema, como sempre, está nas boas intenções, das quais o inferno está cheio.

Quando Cantanhêde propõe um “Comitê de Notáveis” (ideia de Tarso Genro, vai vendo), a questão sempre vai estar em quem vai escolher esses notáveis. A escolha de Cristiano Zanin para a vaga de ministro do STF dá uma boa noção do que Lula entende por “notável”. Essa ideia de um comitê apartidário somente com sumidades parte do pressuposto de que há pessoas por aí que são praticamente assexuadas, imunes a paixões, incluindo as políticas. Obviamente, não existem. Além disso, como disse acima, há a questão da escolha desse comitê, um assunto sempre delicado. Por isso existem eleições, de modo a que os eleitos contem com a legitimidade do voto popular para exercer o poder. Comitê de Notáveis à margem do Congresso é das ideias mais antidemocráticas que circulam na praça.

Temos a ilusão de que uma Grande e Profunda Reforma Política resolverá todos os nossos problemas. Não resolverá. É mais provável que seja sequestrada pelos interesses das maiorias conjunturais. É preferível avançar aos poucos, na direção correta, como foi o caso do fim das coligações em eleições proporcionais e da cláusula de barreira. Algum grau de voto distrital poderia ser o próximo passo. Mas, claro, nada disso resolverá o problema de Lula, que pretende exercer o poder de maneira hegemônica. Nesse caso, o problema não é o sistema de representação. O problema é a existência da própria democracia.

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