Aí você vai ler a reportagem, e a “especialista” é professora da FAU-USP, que diz platitudes do tipo “é preciso investigar a fundo as necessidades de mobilidade da grande metrópole” ou “é preciso uma política para ampliar o transporte de massa”.
Segundo o responsável pela PPI, entrevistado na reportagem, hoje a Zona Azul perde 50% da receita por problemas de fiscalização. A reportagem não diz, mas é fácil concluir: se aumentar a fiscalização, potencialmente diminuirá o número de carros estacionados nas ruas de São Paulo, pois afastará aqueles que não pagam.
Mas trata-se, claro, de um raciocínio muito sofisticado para a “especialista” ou para a “jornalista”, que não passam de militantes da causa estatista: tudo o que não está nas mãos do Estado é “projeto de planilha Excel” (expressão citada pela “especialista”), que só tem olhos para o “lucro”.
Enquanto sonham com um mundo utópico onde todos são felizes se movimentando de teletransporte, que se exploda o cidadão, que precisa de serviços mais eficientes, e a prefeitura, que abre mão de arrecadação por ineficiência.
O mercado financeiro era “alckmista” nas eleições porque gosta de ganhar os juros da dívida pública na maciota, segundo Paulo Guedes.
Guedes sabe muito bem que o mercado financeiro era alckmista porque avaliava que Alckmin teria mais convicção e habilidade política para aprovar a reforma da Previdência no Congresso, que é o que realmente vai diminuir a dívida pública no longo prazo. Por enquanto, com suas declarações desastradas e sua falta de foco na reforma, Bolsonaro vai dando razão à Faria Lima. Alckmin teria menos convicção para tocar a agenda de privatizações? Bem, o atual governo já disse que Petrobras, Caixa e Banco do Brasil são imexíveis. E mesmo coisas mais simples, como o IPO da asset do BB, esbarram em “problemas”.
Por enquanto, a agenda liberal do “único governo liberal da história do Brasil” se resume à rodada de concessões de aeroportos, privatização da Eletrobrás e leilão do pré-sal. Toda ela herdada do governo Temer.
O governo tem menos de 100 dias, é verdade, está ainda se organizando, é injusto cobrar alguma coisa. Vamos ver o que Bolsonaro e Guedes entregarão em quatro anos. Guedes sabe que a Faria Lima aplaudirá de pé se conseguirem fazer metade do que prometeram. Mas, para isso, é preciso começar a trabalhar mais e falar menos.
A última desculpa para não abrir o capital da asset do BB é que grande parte da receita vem de um fundo de R$ 53 bilhões com taxa de administração de, atenção!, 4% ao ano!!!
Os cotistas que são tungados pelo BB são autarquias e órgãos do governo em geral, que são obrigados a investir o caixa nesse sorvedouro de recursos públicos. Trata-se de uma gigantesca transferência de recursos (R$ 2 bilhões ao ano) do governo para o BB, em forma de taxa de administração.
São 160 mil cotistas (nunca pensei que houvesse tanto órgão de governo no Brasil!), o que dá mais de R$ 300 mil de investimento por cotista. Para esse montante de dinheiro, qualquer pessoa física consegue fundos conservadores por taxa de administração de, no máximo, 0,2% ao ano.
Aí, ao invés de eliminar a distorção, o novo e liberal presidente do BB diz que esse pode ser um empecilho para a privatização. De onde se deduz que a estrutura da BB asset não sobrevive sem esse fundo.
Então, ficamos assim: o Tesouro continua subsidiando a asset do BB, enquanto este governo continua posando de liberal até a segunda página.
Pedro Cafardo é editor-executivo do Valor Econômico.
Hoje, Pedro comete uma coluna mais ou menos assim:
– O liberalismo tomou conta do governo brasileiro. E isso é bem-vindo, dado que o Estado brasileiro está falido e não consegue mais cumprir com suas obrigações.
– No entanto, seria bom olhar para o que está acontecendo lá fora: Trump e até a liberal Alemanha estão mudando as regras do jogo e protegendo suas indústrias “estratégicas”.
– Pausa na coluna para a descrição da “experiência” e do “orgulho” de voar em uma aeronave da Embraer na África do Sul. Uma “emoção”.
– Depois de demonstrar, com essa “experiência”, o quanto a Embraer é “estratégica” para o Brasil, o articulista volta a falar da tal “onda antiliberal” no mundo e como o Brasil, com o novo governo, está na contramão.
– Por fim, questiona se este seria o melhor momento para vender as estatais brasileiras. Afinal, se a joia da tecnologia brasileira foi vendida por “míseros” US$ 5 bilhões, quanto valeriam as outras joias?
Vou começar a descascar a partir desse “míseros” na frente dos 5 bi. O editor-executivo do Valor, o maior jornal de finanças do país, não sabe o que é valuation de uma empresa. Trata seus acionistas como um bando de idiotas, que não sabem fazer contas, e estivessem vendendo o “patrimônio brasileiro” a preço de banana. Segundo Cafardo, o Estado brasileiro precisa intervir, impedindo que os acionistas façam essa besteira. Afinal, só o Estado sabe o quanto realmente vale esse “orgulho nacional”.
O final dessa história já sabemos: sem condições de competir no mercado global, em determinado momento a Embraer fecharia fábricas, demitindo milhares de empregados. Clamores se levantariam para que o governo “fizesse alguma coisa” para preservar os empregos e subsídios seriam dados para manter uma empresa zumbi, sem condições de sobrevivência.
Protegemos indústrias ao longo de décadas e os resultados estão aí para quem tem olhos para ver. Queremos fazer o que supostamente estão fazendo agora EUA e Alemanha, sem ter antes colocado as condições para a acumulação de capital físico e humano, coisa abundante nos dois países. O resultado é o crony capitalism, uma corruptela do capitalismo. Aliás, não deixa de ser curioso um editor do Valor elogiando a política de Trump no que ela tem de mais imbecil.
Por fim, de maneira marota, Cafardo dá um salto quântico no artigo, passando para a venda das estatais. O único link possível entre os dois casos, Embraer e estatais, é o seu valor estratégico. Mas o colunista não cita o valor estratégico, mesmo porque é difícil defender que, por exemplo, os Correios tenham algum valor estratégico. Cafardo vai pela linha do valor da venda: a Embraer, joia da tecnologia nacional, foi vendida por míseros 5 bilhões. Seria este o momento de vender as estatais? Como se o Estado brasileiro estivesse nadando em dinheiro e tivesse escolha. E, pior, como se as empresas estatais, continuando nas mãos do Estado, pudessem algum dia valer mais.
A coluna de Pedro Cafardo tem sua utilidade. Quando um editor-executivo do maior jornal de finanças do país comete um artigo desse naipe, tomamos consciência da lama em que nos encontramos.
Espero sinceramente que este governo, que se diz o único verdadeiramente liberal da história do Brasil, não continue com essa historinha petista de que “não precisa privatizar, basta ter uma gestão técnica e livre de influências políticas”.
O presidente da Caixa não está recebendo os parlamentares. Ele diz que tem mais o que fazer. Seu mandato, quando foi contratado, foi o de sanear o banco, não o de atender demandas parlamentares.
Vamos observar um pouco mais de perto a coisa.
Por que os parlamentares querem tanto falar com o presidente da Caixa? Que tipo de poder ele possui, que atrai tanta gente?
A resposta não é difícil: dinheiro. O presidente da Caixa tem um poder discricionário sobre o que o banco faz com o seu capital. Existe ali uma espécie de “orçamento paralelo”, em que o congressista consegue dinheiro sem precisar passar pelo desgastante processo parlamentar. O que o presidente da Caixa, Paulo Guedes e o próprio Bolsonaro ainda não entenderam (ou fingem não ter entendido), é que a própria existência da Caixa (e do Banco do Brasil) não faz sentido se não for para servir como um orçamento paralelo. Qual o sentido do Tesouro ser acionista de um banco que se pauta pelas mesmas regras de um competidor privado?
Aqueles ingênuos que são contra a privatização dos “bancos oficiais” porque pensam que é possível fazê-los rentáveis através de uma administração austera (como é o caso hoje), deveriam dar ouvidos às queixas dos parlamentares. É questão de tempo para que o bem-intencionado presidente da Caixa abra as portas de seu gabinete. Essa é a lógica da existência da Caixa.
Não há solução de compromisso: ou se coloca a privatização corajosamente na mesa, ou a Caixa vai ser saneada para voltar a ser exatamente o que era: uma forma de driblar o orçamento da União.
Se fosse verdade que “todos ganhariam se o BB fosse privatizado”, o BB já estaria privatizado.
Perderiam os políticos, que não teriam onde colocar seus apaniguados (este governo é uma exceção, vamos ver até quando).
Perderiam os funcionários, que são protegidos pelo status de “concursados”.
Perderiam os empresários, que dependem da meia-entrada dos recursos subsidiados.
Esse “todos” se refere a todos os brasileiros que não pertencem a nenhum dos grupos acima. Mas a maioria dos que seriam beneficiados são enganados pela cantilena do “patrimônio do povo”.
Como diz o presidente do BB, quem sabe um dia os maiores beneficiados acordem.
Pelo que eu entendi da reportagem do Valor hoje, é o seguinte: os governadores estão fazendo lobby para retirar a obrigatoriedade de licitação pública para obras de saneamento nos municípios. Com a licitação pública, as estatais não conseguem competir com as empresas privadas. Hoje, os municípios podem contratar obras de saneamento diretamente com as estatais, sem licitação.
Desde 2007, R$3,5 bilhões de recursos a fundo perdido não foram utilizados porque as estatais de saneamento não conseguiram tirar os projetos do papel. Segundo a reportagem, metade da população brasileira não tem acesso a tratamento de esgoto.
Segundo o vice-governador de São Paulo, se a MP continuar do jeito que está, a Sabesp precisará ser privatizada, pois não tem como competir com empresas da iniciativa privada nas licitações.
Por mais que eu procure, não consigo pensar em argumentos melhores para privatizar toda essa joça.
O que vai a seguir é um trecho da reportagem de sexta-feira, no Valor, que descreve um suposto “desalinhamento” entre o secretário de privatizações, Salim Mattar, e o presidente do BB, Rubem Novaes.
A reportagem, recheada de citações de “fontes” não identificadas, faz parte claramente do lobby dos funcionários de carreira para evitar perderem os seus feudos.
O trecho abaixo contém o núcleo da argumentação: não se pode passar para a iniciativa privada as partes lucrativas do banco, importantes para a sua rentabilidade.
Esse diagnóstico parte de uma premissa equivocada: a de que o Estado deve ter o papel de empresário, ou seja, deve colocar o dinheiro arrecadado dos impostos em atividades arriscadas, com vistas a aumentar a sua rentabilidade. Não! Mil vezes não! O Estado serve para prover coordenação social e serviços que, de outra forma, não seriam prestados pela iniciativa privada. Todos eles “não lucrativos”, por definição. Não me parece que a atividade bancária seja um deles. A não ser que se queira um banco “não-lucrativo”, o que contradiz a afirmação de que não se pode privatizar porque o banco “é lucrativo”. Ora, se é para ter a mesma lucratividade de um banco privado, por que raios precisa ser estatal?
O Estado não precisa de bancos para fazer política social. Subsídios podem ser concedidos via orçamento público, diretamente nas mãos dos beneficiários de empréstimos concedidos por bancos privados. Existem apenas três motivos para a existência de bancos públicos: conceder benefícios por fora do orçamento público (o que inclui as pedaladas da Dilma), servir de barganha política ao oferecer inúmeros cargos de confiança e proteger uma casta de funcionários públicos concursados indemissiveis.
Dizer que o Banco do Brasil não pode ser privatizado porque “é rentável” é só uma desculpa para manter o feudo intocado.
1. Os governos Lula e Dilma (que curtiu o tuite) tiveram mais de 13 anos para reestatizar a empresa mas não o fizeram. Por que?
2. Quantas barragens teriam cedido se a Vale fosse estatal?
3. Alguém duvida de que se a Vale ainda fosse estatal teria entrado no esquema de corrupção do PT? Teríamos o “mineirão”.
É óbvio que há falhas graves na gestão de riscos da Vale, não é isso que se está discutindo. Que se tomem as devidas providências de punição aos culpados e mitigação de riscos futuros.
Isso é uma coisa. Outra coisa é usar essa tragédia como crítica às privatizações. Isso só tem um nome: canalhice.