OCDE ou não OCDE, eis a questão

Já está claro que a carta de recomendação dos EUA não vetou o Brasil na OCDE, apenas recomendou Argentina e Romênia, provavelmente por uma questão de ordem cronológica do pedido de adesão.

O problema, portanto, não foi essa carta de recomendação. Os problemas são outros dois: 1) o fato dos governos petistas terem desperdiçado a chance de ouro do Brasil pleitear uma vaga na OCDE e 2) o governo Bolsonaro ter criado a falsa expectativa de que sua “amizade” com Donald Trump faria com que o Brasil “furasse” a fila.

Os governos Lula e Dilma nutriam pela OCDE o mesmo desprezo estampado hoje na entrevista de Rubens Ricupero, que reproduzi no post anterior. Para eles, o que importava era ter uma liderança no mundo pobre, ser uma espécie de “EUA dos miseráveis”. Foi um erro de leitura em dois sentidos.

Primeiro, países pobres querem ser ricos, não querem fazer parte de um “clube dos pobres”. Tirando talvez Cuba e Venezuela, “pobre gosta de luxo, quem gosta de miséria é intelectual”, como dizia o imortal Joãozinho Trinta. Esse foi o erro geopolítico.

O segundo erro foi ideológico: uma certa prevenção contra os “ricos”, que não estaria de acordo com nossa vocação de pobre. Esta é a crítica de Ricupero e dos intelequituais de maneira geral. Ricupero diz que pertencer à OCDE não nos fará ricos. Sem dúvida, a simples pertença ao clube não faz de ninguém “rico”. Mas a OCDE tem regras rígidas de comportamento econômico, que “puxam” o país para cima. Pertencer à OCDE significa que o país tem a intenção de seguir estas regras, o que dá a seus membros um status diferenciado quando se trata de receber investimentos. Ricupero cita a Grécia como contra-exemplo, um país que quebrou mesmo fazendo parte da OCDE. Bem, a Grécia fraudou a União Europeia, o FMI e a OCDE com uma contabilidade falsificada (uma versão grega das “pedaladas”). Mas o fato de pertencer à Zona do Euro e à OCDE forçou a Grécia a fazer a lição de casa, algo muito mais dacroniano que o nosso teto de gastos. Isso é o que importa: ser forçado pelas instituições a dar um basta, e não continuar escorregando ladeira abaixo, como estão ainda fazendo Venezuela e Argentina.

Os governos petistas, portanto, foram os autores do erro original. O governo Bolsonaro, por sua vez, criou a expectativa de que o seu relacionamento com Trump poderia compensar este erro. Não contava que, relacionamento por relacionamento, o de Trump com Macri tem raízes muito mais profundas.

O Brasil pleiteou sua entrada na OCDE em 2017, um ano depois do pedido da Argentina. A expectativa criada foi a de que pudesse haver uma inversão dessa ordem. Poderia ter havido, mas não houve. O caso da Argentina será analisado antes e, provavelmente, não será aceito. Mas o Brasil ficou para depois, como era natural, dada a ordem cronológica. O problema foi a expectativa criada. O que se viu é que o Brasil continua sendo um parceiro a mais dos EUA, nada realmente especial, como quis vender o governo Bolsonaro.

Continuaremos a fazer a nossa lição de casa e, em alguns anos, entraremos na OCDE. Mas será no ritmo normal dessa organização, sem atalhos imaginários.

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