Alguém sempre está pagando pelas políticas públicas

O Senado decidiu não incluir cotas para filmes nacionais nos cinemas. O projeto em tramitação na Casa discutirá cotas apenas para a TV paga. Matéria no Estadão volta a discutir essa questão.

Cinema é uma diversão cara. Uma única meia-entrada custa uma mensalidade do Netflix. Por isso, as pessoas pensam muito bem antes de escolher onde vão gastar o seu rico e suado dinheirinho. E como é tomada essa decisão? O consumidor forma a sua opinião com base em alguns elementos: “hype” (todo mundo está falando), grandiosidade da produção, interesse pelo tema etc.

Mas, antes de mais nada, é preciso que o filme seja conhecido de alguma forma. O consumidor comum não é um cinéfilo especializado, que acompanha a indústria e seus festivais. De maneira geral, o filme que ocupa as salas é acompanhado de uma grande campanha de marketing, que procura convencer o consumidor de que vale a pena assistir àquele filme no cinema e não esperar pelo streaming. Para isso, é preciso ter verba de publicidade.

É a isso que se refere o representante das salas Multiplex. A decisão de colocar um filme em uma sala envolve risco. Uma sala vazia é prejuízo. Uma boa estratégia para minimizar esse risco é justamente acompanhar as campanhas de marketing em torno dos filmes. Quanto maior a campanha, maior a chance de ocupar a sala.

Por outro lado, o especialista em cinema defende uma certa “liberdade de escolha”. Estabelecer cotas para filmes brasileiros seria uma forma de garantir essa liberdade ao consumidor. O problema desse raciocínio está em definir quem paga por essa liberdade. Sim, porque alguém precisa pagar pelas salas ocupadas apenas por cinéfilos especializados, que assistem a filmes com baixa verba de publicidade. As cotas transferem esse custo de marketing para os exibidores, que substituem, com o seu prejuízo, a verba inexistente de publicidade. Como os exibidores não conseguem sobreviver com o prejuízo, o custo é repassado para o preço dos ingressos, elitizando ainda mais o divertimento.

Não sou a favor nem contra cotas para filmes brasileiros. Cada sociedade deve definir suas prioridades. A única observação que faço é que não existe política pública “de graça”. Alguém sempre está pagando, mesmo sem perceber.

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